REDUÇÃO DA IDADE PENAL NO BRASIL: DE 18 PARA 16 ANOS (3ª ed., 2019)
A título de Introdução
cumpre dizer que a matéria deste trabalho, largamente discutida no Brasil
sobretudo no primeiro semestre de 2015, tem pelo menos dois aspectos
principais: (a) se convém mudar o dito no artigo 228 da Constituição Federal de
1988; (b) se essa alteração constitucional tem validade jurídica. O objeto
deste artigo nosso diz muito mais com o dito aspecto (b) — se é juridicamente
possível essa mudança diante do artigo 5º da Constituição.
Sendo isso possível, (A) há quem defenda a inconveniência da
mudança, e (B) os que sustentam o contrário: não deve haver qualquer alteração,
a responsabilidade penal tem que começar quando a pessoa completar 18 anos.
Alguns desses argumentos são seguintes, que abaixo vão.
(A) Isto
não convém
por o menor de 18 anos não se intimidar com a punição penal
;
esses menores carecem de capacidade plena para distinguir claramente entre
lícito e ilícito penal; porque a prisão só vai deseducar esses menores, com a
desvantagem de o contato deles com os maiores dentro dos presídios os tornar mais
perigosos.
(B) Isto convém sim
porque a maioria das pessoa prefere viver livremente, sem ter como casa o
intenso sofrimento de uma cela carcerária; quem completou 16 anos é adolescente
e não criança: com 16 anos já pode até votar — artigo 14, § 1º, inciso, II, alínea c) da
Constituição Federal —, de modo que pessoa com 16 anos de idade sabe a
distinção entre candidato bom e candidato ruim;
o adolescente de 16 anos ser condenado, note-se, é diferente de ele cumprir
a pena junto com os maiores de 18 — podem conviver com os de sua mesma idade, mas
separados dos mais velhos.
Pontes de Miranda, matemático que era, aplicou a lógica
simbólica ao Direito na sua obra Tratado
das ações. Sete tomos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1970-1978. As
ações de direito material classificam-se por sua carga de eficácia; reúnem-se
em cinco classes, e cada qual tem algum grau de todas as demais: (1)
declaratória (positiva, ou negativa), (2) constitutiva
(positiva, ou negativa), (3) condenatória, (4) executiva
e (5) mandamental (positiva, ou negativa). Ora, a possível
condenação do menor de 16 anos (ação
condenatória) não implica em cumprimento da pena imposta junto com os condenados
de mais idade. Assim é também pelo fato de o cumprimento da pena ser o próprio
objeto de outra ação proposta pelo
Estado — cuida-se de uma ação executiva.
Seja como for, para muitos se trata de uma questão difícil
de ser elucidada. Jornalista respeitado, membro da ABL (Ferreira Gullar) pensa
deste modo
.
Cumpre dizer-se a esse respeito ser possível alterar o conteúdo do artigo 228
da Constituição, com uma vantagem: pode estabelecer-se, na própria mudança, que
a vigência do texto é por cinco anos; passados estes, o Congresso nacional pode
revogar a dita alteração, e promover um
plebiscito
para se saber o mais aprovado pelo Povo brasileiro (Constituição Federal de
1988,
artigo 14, inc. I). Realiza-se
com isso, vantajosamente, a
experimentação,
o terceiro passo do método científico (método indutivo experimental)
.
Ora bem, a outra questão — (b) se é juridicamente possível essa
mudança diante do artigo 5º da Constituição — vem a ser o cerne do
presente trabalho.
Nossa opinião é que sim, pode ser reduzido o início da
capacidade penal, de 18 para 16 anos. Diremos abaixo não estar contida no
artigo 5º matéria regrada no artigo 228 da Constituição Federal de 1988. desenvolveremos
esta ideia no item I. No item II falaremos mais taxativamente sobre
essa possibilidade trazendo à balha os argumentos contrários do procurador
geral de Santa Catarina, ao modo como os defendeu em trabalho publicado. No
item III acha-se a continuação
desses argumentos com a nossa resposta dada caso a caso. Por fim no item IV serão expostas as conclusões deste estudo.
I — São inalteráveis por Emenda somente as
matérias regradas no artigo 5º da Constituição Federal de 1988
Consta da Constituição Federal de 1988 o seguinte (o que nos
pareceu digno de atenção especial nós o pusemos em letra itálica):
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata.
§ 2º - Os direitos e garantias
expressos nesta Constituição
não excluem
outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Art. 6º São
direitos
sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer,
a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a
assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
(Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 64, de 2010)
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança, ao adolescente e ao
jovem, com absoluta prioridade, o direito
à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 1º O Estado promoverá programas
de
assistência integral à saúde da
criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades
não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes
preceitos:
Artigo 228: São penalmente inimputáveis os menores de
dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.
Entendeu-se no Supremo Tribunal
Federal que também os direitos sociais
não se podem alterar por Emenda (artigo 6º). Em sendo assim, se sobrevier nova
regra jurídica constitucional segundo a qual o salário mínimo não precisa de
cobrir o lazer com aplicação com correção monetária, será ela uma regra
jurídica inconstitucional. Também se ficar estabelecido que a multa a ser
aplicada ao empregador, por despedir sem justa causa o empregado, será
calculada em percentuais do salário mínimo. Seria nula também a alteração da
norma constitucional segundo a qual o 13º salário do empregado aposentado
passasse a ser só de 90% do valor da sua aposentadoria.
Se assim fosse, seriam imodificáveis
por emenda, em nada se poderia
alterar todo o respeitante a educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia,
lazer, segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância,
a assistência aos desamparados.
Haveria de ser algo assim
como um desatino.
II — É constitucionalmente possível,
com Emenda, baixar para 16 anos a responsabilidade penal
Discutimos agora os
argumentos trazidos a lume pelo então procurador geral de justiça do Estado de
Santa Catarina (Gercino
Gerson Gomes Neto) no seu trabalho “A
inimputabilidade penal como cláusula pétrea” .
Cumpre assinalar de
início ser tecnicamente imprópria a expressão “cláusula pétrea”, pois cláusula é proposição ou conjunto de
proposições em que os figurantes de negócio jurídico, ou de ato jurídico
"stricto sensu", fixam as suas posições nele assumidas — vantagens e
desvantagens asseguração pelo Direito (o Direito é um dos sete mais importantes
processos sociais de adaptação). Não se trata jamais, pois, na cláusula de
questão fática (parte de suporte fático sobre que vai incidir regra jurídica), não
se cuida nunca de norma de direito. Ora bem, as normas de uma constituição são regras susceptíveis de incidir; não são elas qualquer suporte fático.
Vamos, pois,
a alguns argumentos do ilustre procurador de justiça do Estado de Santa
Catarina — dr. Gercino Gerson Gomes Neto.
“O parágrafo 2o do artigo 5o diz que
são direitos e garantias individuais as normas dispersas pelo texto
constitucional, não apenas as elencadas no dispositivo mencionado”. [...] Diz
o parágrafo 2o do artigo 5o: "Os direitos e
garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime
e dos princípios por ela adotados, ou dos ou dos tratados internacionais em que
a República Federativa do Brasil seja parte" [...] Assim, este parágrafo
nos traz duas certezas.
Resposta nossa: o fato de não estarem
incluídos é diferente de aí colocarmos as questões de lege ferenda que
estimaríamos estarem lá em forma de regra jurídica constitucional. Falta na
Constituição Federal de 1988 todo e qualquer princípio segundo o qual a
responsabilidade penal esteja proibida de baixar de 18 para 16 anos. Nem existe
tratado (negócio jurídico de Direito das Gentes ou direito supraestatal) por
força do qual ao Brasil seja vedado baixar essa idade de responsabilidade
penal.
[...] a própria Constituição Federal admite que encerra em seu corpo, direitos
e garantias individuais, e que o rol do artigo 5o não é exaustivo.
Resposta nossa:
para se dizer que o artigo 5º da Constituição Federal de 1988 não é exaustivo
cumpre demonstrar a verdade dessa proposição assim generalizada. O
estabelecido no artigo 5º, § 2º (“Os direitos
e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do
regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que
a República Federativa do Brasil seja parte”) tem outra conceituação
jurídica. Leia-se o escrito pelo professor José
Afonso da Silva
quando explica o sentido do que sejam “outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados”.
Mostra ele que se cuida de
(1)
direitos individuais expressos, aqueles explicitamente
enunciados nos incisos do art. 5º; (2) direitos
individuais implícitos, aqueles que são subentendidos nas regras de
garantias, como o direito à identidade
pessoal, certos desdobramentos do direito à vida, o direito à atuação geral
(art. 5º, II); (3) direitos individuais decorrentes do regime e de tratados
internacionais subscritos pelo Brasil, aqueles que não são nem explícita nem
implicitamente enumerados, mas provêm ou podem vir a provir do regime adotado,
como o direito de resistência, entre
outros de difícil caracterização a priori.” [...]
Percebe-se pois que, segundo esse respeitável jurista
mineiro, a não explicitude consiste no próprio conteúdo de conceitos do artigo
5º, ou seja,
identidade
pessoal, direito
à vida, direito à atuação, direito de resistência. Sim, porque identidade pessoal se vincula ao direito
à segurança (artigo 5º) — sem a sua identidade a pessoa andará insegura. Essa
mesma identidade se vincula a
palavras do artigo 5º: inviolabilidade da intimidade, inviolabilidade da vida privada, inviolabilidade da imagem das pessoas.
Também a reprodução da imagem de qualquer um. Acresce ainda o
seguinte — reza a Constituição Federal de 1988: conceder-se-á "habeas-data": *-* para assegurar o
conhecimento de informações relativas à
pessoa do impetrante.
No tocante ao direito
à atuação consta no artigo 5º da Constituição
Federal de 1988 que é livre a locomoção no território nacional. Relativamente ao direito de resistência
a que alude o professor J. Afonso, está outrossim na nossa
constituição federal que a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito,
bem como o direito de fazer ou não fazer
alguma coisa.
Em síntese, pois, tem-se isto — a
regra jurídica constitucional do artigo 5º § 2º (“Os direitos e garantias
expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos
princípios por ela adotados”) só diz respeito a fatos já existentes
na regra do caput. Não traz nenhum elemento
de outra regra jurídica constitucional como a do artigo 228 (são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às
normas da legislação especial.
Por outras palavras, nada impede que a idade de
responsabilidade penal seja de 16 anos, alterando-se a atual norma posta no
artigo 228 da Constituição Federal de 1988.
Continua a insistir o eminente procurador geral, alegando
com tratados de que o Brasil seja signatário:
[...] direitos e
garantias concernentes com os princípios da própria Constituição e de tratados internacionais firmados pelo
Brasil, integram referido rol, [...]
Nossa resposta: Ora, não existe a este respeito tal norma
jurídica na Carta da ONU,
sendo certo também que essa idade penal varia de povo para povo entre vários os
países.
Note-se que aqui se estuda como
vige a Constituição Federal de 1988, e não como as pessoas gostariam que vigesse. Essa vontade de outra vigência expressa uma
situação a respeito de como deve ser a norma: é uma quaestio de lege ferenda. O que está a viger é matéria da regra
jurídica já produzida: cuida-se, assim, de uma quaestio de lege lata. Uma mudança de norma de direito há de
atender ao que mais convém ao Povo, segundo a Constituição federal vigente — Art.
1º Parágrafo
único. Todo o poder emana do povo.
Em regime democrático isso é incumbência primacial do Poder Legislativo,
da maneira como vem regrado na Constituição, artigos 44-60 — o modo de as
Emendas mudarem a Constituição é conteúdo do artigo 60, cujo texto é:
A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados
ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembleias Legislativas das
unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa
de seus membros.
§ 1º - A Constituição não poderá ser
emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado
de sítio.
§ 2º - A proposta será discutida e votada em
cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se
obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.
§ 3º - A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas
da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda
tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV
- os direitos e garantias individuais.
§ 5º - A matéria
constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode
ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.
Quanto aos
tratados, ou convenções, ou acordos, há de levar-se em conta que não se
relaciona com a idade de responsabilidade penal nenhum negócio jurídico de
Direito das Gentes ou direito supraestatal, de que o Brasil é signatário,. Esse
argumento é inane na discussão do problema jurídico ora sob discussão. Acresce
a circunstância de inexistir tratado, ou convenção, proibitivos de maioridade
penal aos 16 anos, afora uma única situação. Assim é que o professor
Tiago Ivo Odon só alude a dois casos de Direito das Gentes ou direito
supraestatal onde se faz menção, apenas sobre a pena de morte ao menor
de 18 anos. São: (1) a Convenção Americana de Direitos Humanos
(1969) — também conhecida como “Pacto de San José — e (2) o Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos da ONU (1966). Acentua o autor,
porém, que
[...] apenas
proíbem
a aplicação da pena de morte a menores de dezoito anos.
(
grifo nosso).
III — Outros argumentos do ilustre
procurador geral.
[...] a própria
Constituição Federal admite que encerra em seu corpo, direitos e garantias
individuais, e que o rol do artigo 5o não é exaustivo.
Resposta. Esse “rol” é, sim, exaustivo. O que
aparentemente contém a mais são as explicitações lógicas dos conceitos dela
própria, como o professor José Afonso da Silva mostrou nos trechos indicados acima.
[...] direitos e garantias concernentes com os princípios da própria
Constituição e de tratados internacionais firmados pelo Brasil, integram
referido rol, mesmo fora de sua lista.
Resposta. Cumpre insistir: nada há fora do mesmo
artigo 5º, que se possa definir como sendo também do mesmo núcleo rígido
da Constituição Federal de 1988 (núcleo rígido, ou “cláusula pétrea” — o que é
isto?!...). O trabalho do professor José Afonso da
Silva é preciso nesses pontos.
[...] inciso IV, do parágrafo 4o, do
artigo 60, [...] o dispositivo refere-se à não abolição de todo e qualquer
direito ou garantia individual elencados na Constituição, não fazendo a ressalva de que precisam estar previstos no artigo
5º. (é nosso o ressaltado em itálico)
Resposta: essa
ressalva não precisava de ser feita; a razão é a mesma acima dita por nós — a
não explicitude consiste no próprio conteúdo de conceitos do artigo 5º, ou
seja, identidade pessoal, direito à vida, direito à atuação, direito de
resistência. Sim, porque identidade
pessoal se vincula ao direito à segurança (artigo 5º) — sem a sua identidade a
pessoa andará insegura. Essa mesma identidade se vincula a palavras do artigo
5º: inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da imagem das pessoas.
Também a reprodução da imagem de qualquer um. Acresce o seguinte que também
reza a Constituição Federal de 1988: conceder-se-á "habeas-data":
a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do
impetrante. [...] No tocante ao direito à atuação física consta no artigo
5º da Constituição Federal de 1988 que é livre a locomoção no território
nacional. Relativamente ao direito de resistência, a que alude o professor J.
Afonso, consta outrossim na nossa constituição federal que a lei não excluirá
da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, bem como o direito
de fazer ou não fazer alguma coisa.
“Não são [...] apenas
os que estão no art. 5o, mas, como determina o parágrafo 2o do mesmo artigo,
incluem outros que se espalham pelo Texto Constitucional e outros que decorrem
de implicitude inequívoca. Trata-se, portanto, de um elenco cuja extensão não
se encontra em Textos Constitucionais anteriores".
Resposta:
consta do acima dito por nós neste escrito. Outra alegação é tal consta
das [...] normas das Nações Unidas.
Resposta: não existe norma como essa em regras
jurídicas da ONU.
Ainda outro argumento:
[...] que a criança tenha prioridade na implementação de políticas públicas,
por exemplo, e desta forma, inclusive por questão de coerência jurídico-constitucional
não iria deixar ao desabrigo do artigo 60, § 4º, IV, os direitos e garantias
individuais de crianças e adolescentes [...]
Resposta:
é coerente neste ponto
a Constituição Federal de 1988, pela mesma razão, ou seja, o conteúdo do artigo
228 é estranho ao conteúdo dos artigos 5º e 60 § 4º, IV.
E mais:
[...] os princípios do artigo 227 encontram suporte no inciso acima transcrito
e em todos os outros estabelecidos a partir do inciso XXXIX.
Resposta:
este argumento vem a
ser o mesmo sobre não estar no artigo 5º o material do artigo 228. Outro
argumento:
[...] tal
disposição se coaduna com o regime e princípios adotados na Constituição
Federal.
Resposta:
é verdadeira essa
proposição, mas não prova que o artigo 228 está contido no artigo 5º. Argui-se
do depois:
[...] no que diz respeito ao direito penal e a
vedação de aplicação de certas penas aos cidadãos, vemos: "Art. 5o, XLVII
- não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos
do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de
banimento; e) cruéis;"
Resposta: a responsabilidade penal aos 16 anos está
conforme à regra jurídica de todo o artigo 5º; nada tem contra ele.
Continuando, alega
o ilustre procurador do Estado-membro de Santa Catarina:
O artigo 228,
nada mais é do que a garantia da não-responsabilização criminal da pessoa menor
de 18 anos, justamente em razão da sua condição pessoal de estar em desenvolvimento
físico, mental, espiritual, emocional e social, [...]
Assim, estamos
diante de uma responsabilização especial, não penal, que é um direito
individual do adolescente e, como tal, consubstanciado em cláusula pétrea.
Dito isto, só
nos resta assegurar que este dispositivo constitucional também é cláusula
pétrea, portanto, insuscetível de reforma ou supressão.
Resposta:
equivoca-se o digno
procurador geral de Santa Catarina por idêntica razão. Nenhum direito de
adolescentes brasileiros está garantido pela norma constitucional imutável
por Emenda (artigo 5º da Constituição Federal de 1988).
Prosseguindo, foi dito:
Escreveu J.J.
Gomes Canotilho que "os direitos de natureza análoga são os direitos que,
embora não referidos no catálogo dos direitos, liberdades e garantias,
beneficiam de um regime jurídico constitucional idêntico aos destes.
Resposta: falta analogia de todo em todo entre direitos,
liberdades e garantias do rapaz de 16 anos com o conteúdo jurídico do artigo 5º
da Constituição brasileira.
Ainda:
Concluímos
afirmando que qualquer emenda tendente a abolir do texto constitucional a
fixação da idade penal ou a que pretenda reduzir a idade de responsabilização
penal, será flagrantemente inconstitucional e vedada expressamente pelo artigo
60, § 4º, IV, da Constituição Federal.
Resposta:
os argumentos desenvolvidos pelo ilustre procurador geral de S.
Catarina estão vazios de juridicidade no tocante à questão da diminuição da
capacidade penal, baixada de 18 para 16 anos de idade. A razão repete-se uma e
outra vez, a saber, a regra jurídica do artigo 228 da Constituição Federal de
1988 é estranha aos direitos e garantias assegurados no seu cerne rígido
— este cerne rígido é o traçado pelo artigo 5º da Constituição
Federal. O conteúdo da regra jurídica descrito nesse artigo não leva consigo o
estabelecido no artigo 228, que é o locus
juris da idade de responsabilidade penal — se vai continuar sendo com 18
anos, ou se pode iniciar-se aos 16 anos de idade.
IV — Nossas conclusões
Ao pesquisador, como em geral ao pensador, recomenda-se usar
o método indutivo experimental
.
Com ele dá-se muito mais atenção ao mundo fático (mundo existente fora da mente
humana) que às ideias soltas (ideias imagináveis pela mente humana)
.
Não é verdade, tem-se de admitir, que o emprego do método indutivo experimental
livra o homem de todo erro, mas é verdade, sim, que esse método leva o
estudioso a errar menos.
Muitos são os óbices dos acertos. É razão bastante para se
dar atenção especial à melhor maneira de se controlar o conhecimento. Tem-se no
Brasil obra notável sobre o modo recomendado para bem se conhecer, com menor
número de erros. Trata-se do livro de Pontes de Miranda
O problema fundamental do conhecimento. 2ª ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, sobretudo quando expõe as
reflexões sobre o “jeto”, descoberta original, a nosso ver preciosa, desse
brasileiro
.
Decerto esse não foi o método a que se dedicou o ilustre
procurador geral de justiça, dr. Gersino Gerson
Gomes Neto, em cujas reflexões, a nosso ver, lhe faltaram os cuidados
com a “sabedoria da inteligência”. Parece haver prevalecido uma busca
apaixonada de “sabedoria dos instintos” por isso que se deixa vencer por sua própria vontade, vontade de
manter a idade de 18 anos para a responsabilidade penal. Entretanto, cumpre
prevalecer o desejo de se aplicar a Constituição brasileira como está —
permitir a responsabilidade penal desde os 16 anos de idade. Há, pois, sólido fundamento
para se afirmar que inexiste obstáculo algum de ordem constitucional para a
alteração do artigo 218 da Constituição Federal de 1988, a saber,
São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos,
sujeitos às normas da legislação especial.
A idade de
responsabilidade penal pode, sim, iniciar-se aos 16 anos de idade.
Em síntese, e por fim, não há erro jurídico algum
em se alterar o escrito atualmente no artigo 228 da Constituição Federal de
1988, baixando-se a responsabilidade penal de 18 para 16 anos.
*-*-*-
Bibliografia e referências.
Ler notadamente
as páginas 83-106, em que Pontes cuida de “Dado e Relacional; Universais,
Essências, Espécies”.