MORALIS
INSTITUTIO
Boa
noite, prezado, Sérgio!
Li
o seu livro, por enquanto até à página 64, final do item 2.7.
Estou
indo devagar 1) porque o próprio texto assim o exige no prol de uma leitura
proveitosa; 2) nesses tempos de olimpíada gastei horas perante a tv...
Mesmo
assim, tenho tido um excelente proveito: o título chama a atenção, o conteúdo é sólido,
as suas ideias são autóctones, vez por outra se descobrem novas realidades
do mundo intersubjetivo, a discussão interessa a quem gosta de pensar o mundo no
campo da sociologia, os assuntos estão bem concatenados, tem-se a impressão de você
estar ao lado de quem o lê. O processo social de adaptação MORAL está exposto
em variadas acepções.
Talvez
quadra pensar até mesmo em tradução ao castelhano — ao menos na América Latina
se encontrarão leitoras e leitores interessados em ler seu excelente livro.
Se
houver segunda edição, atrevo-me a sugerir que se cogite da moral igualmente como
modo desejável da vida humana, ou seja, parece moral uma convivência composta
dos novos direitos do homem ao modo como os concebeu Pontes de Miranda pelo menos
em três livros; refiro-me a subsistência, trabalho, educação, assistência
e ideal. Passo-lhe abaixo o texto “digitalizado” no meu laptop:
DIONYSOS CO-ETERNO
Eritis sicut dii.
GEN., III, 5.
COLLECÇÂO DOS 5 DIREITOS
DO HOMEM
S
C I E N C I A E TRABALHO
I
PONTES DE MIRANDA
Os
Novos Direitos do Homem
1933
_________________________________
E D I T O R I A L A
L B A L I M I T A D A
Rua Lavradio n. 60
— Rio de Janeiro
_________________________________
Composto
e impresso na typographia ALBA,de Moreira, Cardoso
& Freitas, Ltda. —Rua do Lavradio. 60 — Rio
Nos
dias que correm e em todas as latitudes do
globo,
a estructura social estremece. Ainda poderia haver confiança por parte dos
menos atilados, se os exemplos de esbarroudamento não se multiplicassem,
se a
crise, economica, política e social, não se aggra- vasse cada mês que passa.
Não
ha salvação fóra das duas palavras que servem de sub-titulo á esta collecção:
Sciencia e Traba-
lho .
As formulas que evitem as grandes catastrophes não pódem ser achadas sem
meditação. E' preciso
sondar
os terrenos, ouvir todos os estalos do edifício, procurar, todas as rachaduras,
para que se possa sa-
ber,
com segurança, o que ainda se pôde aproveitar.
Mas,
principalmente, o que se deve CONSTRUIR.
CAPITULO I
O grande problema: A crise do Estado
Existe a crise do Estado?
Já se não pôde occultar. Crise de conteúdo
e de forma. Os que pensam ser só de forma
procuram estructura nova, que o faça conva-
lescer; os que só vêem a de conteúdo,
acredi-
tam demasiado no valor da "sua" convicção,
sem os meios technicos para impô-la aos
factos.
Urge descobrir as variantes de conteúdo e
de
forma, próprias para cada povo.
Depois de
tal acquisição objectiva, sêca (secura
peculiar
a tudo que é quantificavel, racional,
scientifi-
co,
indicativo), ter-se-á de ligar á vontade,
á
força, que torne Lei o resolvido, que lhe
dê
vitalidade e efficiencia criadora.
E' possível, hoje, tal acontecimento? Co-
mo,
se o homem dos nossos dias já não crê no
Heróe,
na Razão, no desvalor da vida terrena transcendentemente compensado na outra vi-
da?
Não é elle um ser politicamente amoral,
ser
que não está "além do bem é do mal" na
ethica
política, mas que sorri da distincção,
pelo
seu scepticismo da finalidade do Estado?
As considerações que aí ficam, em vez
de
afastarem, focalizam o problema. Mostram
a
sua extrema delicadeza.
O nosso tempo não assiste somente, á in-
venção
de nova estructura política. E' teste-
munha
de toda uma renovação dos conteúdos[1]
de integração política. Muda o exterior,
a morphologia, e muclam os pontos em que
esta-
vam de acordo ou em que se
criam de acordo
as
forças decisivas. Se observarmos os Esta-
dos
novos, veremos que ha pontos comuns
a
todas as novas technicas. Poucos. Não é
possível
crer iguaes todos os esteios sobre os
quaes
repousa a legitimação, por exemplo, dos governos russo, alemão e fascista.
Onde, pois, a verdade? Onde, pois, o nu-
cleo,
o esteiamento, que segure a nova con-
strucção
?
1.
E' urgente uma nova fé social.
Mas onde se encontrará alguma coisa que
enthusiasme e ligue os homens, onde se buscar
o
principio que provoque a adhesão dos espi-
ritos
e dos sentimentos, fora da política leal,
objectiva,
do socialismo? Como suscitar a no-
va
fé em torno de abstracções ou de esperan-
ças
falazes?
O homem do nosso Século nutre-se de
Sciencia
e de Trabalho. Sabe que a superpro- ducção, ou a machina, é possível. Viu queimarem-se
milho, algodão, café, centenas de milhares de carneiros e livros, quebrarem-se
machinas e utensílios, para que uma pequena parcella da humanidade continue a
ter lucros. Em vez do fogo a serviço do individualismo ca-
pitalista,
pede, e com razão, a economia de plano, a distribuição dos bens materiaes e
espiri- tuaes da vida.
Se a superproducção foi fácil, mais fácil
será
a producção e o consumo racionalizados.
O gênio destructivo do capitalismo que
inutiliza generos alimenticios, livros, machinas e utensílios, deve ceder lugar
á mentalidade constructiva, á mentalidade que sabe, de antemão, o que
precisa
consumir e guardar, e o
que
precisa
produzir para o consumo e para
as
reservas.
Certa vez dissemos que as fornalhas e os
capinzaes onde se metem café, milho, algodão, livros e carnes, são os cirios
accesos pelo individualismo capitalista, antes de morrer. Infelizmente o
suicida excentrico não se satisfaz
com
isso: da queima de generos e de objectos machinofacturados passará, segundo
sabe fa-
zer,
á "queima" de homens, nas praças publi-
cas
e nas trincheiras.
Os scientistas, os technicos, os
directores de serviço não pódern ficar ao lado delle: a Sci- encia ensinou-lhes
outra maneira de resolver
os
problemas, outra feição, humana, de andar para a frente.
Todos elles crêem no aperfeiçoamento
illimitado, porque todos elles sabem que a "adaptação constantemente
cresce" e que os phenomenos, sempre oriundos de dissymetrias, são pontos
vencidos para a maior symetria...
O
Physico, o Sociologo e o Proletário podem dar-se as mãos e decidir, — dentro da
ordem,
se
possível, — da criação da nova Ordem.
O simples raciocinio reflexivo, a fria
atti- tude de olhar as leis
scientificas, não basta
para
a Acção, para a edificação criadora concreta. Converte-se em
quietismo.
Serve e satizfaz ao sábio; serve,
porém não satisfaz, ao guia de povos, ao
Homem de acção. Este necessita crer, precisa inserir-se
nos
factos. Portanto, necessita de valores, com que jogue (e
não só veja), e precisa de vonta-
de, de affirmação
pessoal, exactamente o contrario do que se exige ao pesquisador objecti-
vo,
que é a despersonalização methodica.
Inserir-se nos factos querem todos os que
se propõem a dominar, a dirigir, a guiar. Caudilhos e Grandes Homens. E' o
appetite de dominação, vulgar, como todos os appetites. O autocrata, os
chefes democráticos e todos os outros estão sempre prontos a pôr mão de
ferro
sobre as realidades, torcê-las a seu jeito, dar-lhes a direcção que lhes apraz
ou a "falta
de
direcção" de que, vazios de sentido estatal, são capazes. O que é difficil
é a linha rija,
o
valor univoco, o ponto de apoio, que divida
os
actos em bons e máus. No fundo, a ethica política. Sem isto,
nada se constróe de solido.
Que é que dará este valor, este sentido e
esta direcção?
As soluções mais fáceis foram a
autocracia
e a codecisão democratica, quer dizer —
o
poder pessoal
(o inserir-se sem o sentido,
sem a direcção
impessoal) e a supposição de
que
a vontade da maioria exprimirá a "ver-
dade",
o "bem".
Ora, ambas satisfazem como fôrma e não
como conteúdo; na apparencia,
resolvem; na realidade, não. Nos resultados, a autocracia submete o social ao
indivíduo dominante, sombra transitória, acção que passa e é seguida de
outras, de outros indivíduos dominantes, dif- ferentes delle (pluralidade no
tempo, talvez contradicções). Nos resultados, a democracia pretende tirar da
pluralidade a unidade e continua a ausência de unidade, de estabilidade e
de
conteúdo.
Dai o seu fracasso. Não tão ra-
dical
como se diz, porque poderia, como veremos, aparar os seus proprios vicios.
Toda formação numérica de maioria afas-
ta
as vontades nítidas, que são, de
regra, minorias difficilmente ajustaveis. A capacidade
de
coalição dos partidos é na razão inversa da nitidez dos seus programmas. A
decadencia
da
democracia deriva, precisamente, de have-
rem
as massas descoberto que a codecisão democrática, por si só, não consegue
fixar o que deve querer, que a fixação
seria contradicto-
ria
com o principio mesmo da democracia, que
é
o da possibilidade de mudar de rumo, da eventual elevação ao poder por parte de
todos
os
grupos. Portanto, da revisibilidade livre dos valores.
Póde-se definir a democracia como o regime da discussão
sobre tudo,
o systema político (quasi disse "apolitico") da provisorie- dade de
todos os fins do Estado. Rigorosamen-
te,
quem diz Estado de fins mutáveis, proviso- rios,
diz Estado sem fins.
A única convicção da democracia recom-
menda-a como processo e não como
conteúdo do
Estado: "a discussão faz a luz". Ora. tal affirmação pôde ser
verdadeira, e pôde ser
falsa:
muitas vezes, a discussão não leva á verdade;
querer
e acertar são coisas
distinctas.
Na
ordem technica (o Estado também é tech- nica), poucos são os que
sabem o que se deve fazer. A sciencia e
a technica sempre se acham em minorias pequeníssimas.
Se essas minorias conseguem mostrar ás
massas que a felicidade do povo augmenta (hoje, o jornal, as estatísticas, o
radio e os cartazes facilitam extraordinariamente a diffu-
são)
e, por este meio, tê-las em seu apoio, o
assentimento popular será mais verdadeiro do que a simples
forma democratica. O povo col- labora na convicção, em vez de só collaborar
na
mecanica representativa. Representação
sem
imperatividade significa perigosa possibilidade de exclusão do povo. (Daí uma
das conclusões a que chegaremos neste escripto: é preciso a
revolução de estructura, que torne impossível a exclusão do povo, do bem
de todos.)
Nos tempos em que o Estado podia es-
tructurar-se com o intuito de se defender ou atacar os outros, havia
finalidade,
escassa mas sufficiente. A religião nacional bastava. Os deuses corporificavam
os seus fins. Com a catholicidade, como que se apagaram, á borracha, os traços
de lapís das differentes finalidades, e reinou, canonica e politicamente, o
universalismo christão, transcendente.
Nos últimos séculos, volveu-se ao Estado
nacional; e, eliminado o valor supranacional
do
christianismo, exaltou-se a razão humana, que conseguiu ser, no Século XVIII, o
succe-
daneo
do universalismo religioso. Eliminada
por
sua vez (o que se dá, em cada indivíduo e
nas
massas, quando se reconhece a possibili-
dade
de caminhos múltiplos racionalmente escolhidos,
donde ser a Razão um moinho que depende dos ventos), que é que trará a direc-
ção, o sentido, a estatica de valores ?
Neste ponto é que estamos, pelo menos os
mais de nós, e é neste ponto que temos de plan- tear o problema do
novo conteiído
e da nova forma do Estado.
2.
Ao tempo das autocracias, acreditava-se em
certo homem, ou em certas famílias, ou em castas, em que se concretizava o
heróe. O he-
róe inseria-se nos factos e era um
valor.
A sua transitoriedade já não satisfaz ás massas do presente. O ultimo reducto
do personalismo lieroico é o cabotinismo esportivo e cinemato- graphico.
Ao tempo da catholicidade, a valorização
da vida transcendente, superior á terrena, obti-
nha
resultados apreciaveis de unidade políti-
ca: dominantes e
dominados criam. Mas, não
só
passou, de facto, o universalismo temporal catholico, como também se trouxe o
problema do bem estar material e
cultural
para o campo da terrenidade: sabe-se, desde
logo, que o pla-
no
politico tém de estar na Terra e resolver-se
a
questão do Estado como se só aqui se te-
nham
de ver os males humanos.
Por outro lado, ha a convicção geral do
fracasso dos "suportes inorgânicos" da vida política: desde o
compromisso da decisão democrática, voluntarismo puro majoritario, até
a
piedade terrena associada á promessa de
outra
vida. O proprio christianismo, em cer-
tos
sectores, solta a política pietista, que esperava do
amor
ao proximo, sem a Lei, a mino- ração da
pobreza e dos males das classes desfavorecidas, para a reestrueturação social
que obrigue o capitalista a ver o pauperismo e o abandono moral e material dos
proletários. E'
o
socialismo christão. Outras religiões rumam para o mesmo caminho.
Da democracia representativa havia-se
es-
perado
que impusesse- o bem do povo. Não
no fez. Entrou em crise.
A socialdemocracia tentou associar ao regime
representativo o imperativo do bem publico. explicito nos princípios
socialistas. Isto seria: I. Ou a) impedir que o
povo não qui-
sesse
taes princípios, b) só permittir a discus-
são
dentro de um circulo, na interioridade de taes princípios. II. Ou — o que se
deu — pôr
o
socialismo em torneio discursador, em luta eleitoral corpo-a-corpo com partidos
não-so- cialistas, portanto deixar sem
solução o problema do fim do Estado. Só teria fim preciso quando um dos
partidos lograsse dominar definitivamente, quer dizer —
quando se estancasse a possibilidade de discussão.
Portanto:
a
própria democracia. Os socialdemocratas falharam.
A
existencia de valores fixos é incompatível com a permissão de se submeter a
votos
o
valor de taes valores. Mas isso não
obsta a que, abaixo de taes valores, isto é, sem poder attingi-los, se facultem
e queiram a collabora-
ção
e a codecisão no exame, o processo mesmo da democracia, mas
interior
ao socialismo. Por-
tanto:
em vez da socialdemocracia, devemos querer o Estado de
fins precisos.
O Estado socialista, com as seguranças
de
princípios e de pratica, dentro dos quaes se exerça a procura de soluções, sem
que estas possam sair das raias daquelles princípios, constitúe a única estructura
de transição dos nossos dias. Como algo de
envolvente
dos fins
do
Estado e determinador delles, não póde subsistir a democracia: ou ella se
interioriza
no
socialismo, tornando-se actividade entre as linhas rijas
do bem de todos, superiores á discussão, ou tem de sacrificar as virtudes que
acaso haja mostrado no inevitável embate das forças renovadoras do mundo,
forças que, oriundas de correntes organicas, ou, até, de raciocínio e de
observação da vida, se apresentam dispostas a prescindir de qualquer ingerência
individual, representativa, nos gover-
nos,
desde que se lhes acene com a sufficiente realização do conforto material e
espiritual de todos.
O
fim do Estado têm de ser substancial
e envolvente, não pôde ser formal e
envolvido.
O
reconhecimento do caracter formal de certas liberdades e da democracia
constitúe uma das mais preciosas acquisições da contemplação sociologica e do
pensamento critico do século.
Temos, pois, que as democracias podem
permanecer como um mecanismo, interior, adaptado dentro de
uma caixa resistente e ho- mogenea. Os seus movimentos não poderão
arrebentá-la, nem, sequer, feri-la. Para isto,
será
de mister que os fins sejam precisos, nitidos, e então,
preliminarmente, se terá de procurar quaes "sejam" estes fins ou
quaes "de-
vam"
ser.
Dissemos "quaes sejam ou quaes devam
ser", porque: ou o Estado os tem
essencial-
mente
ligados a si, ou o Estado pode adoptar
uns
ou outros.
Donde o problema preliminar: ha fins
que
definem o Estado, ou o Estado póde mu-
dar
de fins?
3.
Se é certo que o Estado tem fins que o
definem, muda, quando muito, a expressão
desses fins. Se, ao contrario, póde o Estado mudar os seus fins,.á cada
mudança dos fins
o
Estado se transforma essencialmente, por-
que
lhe desappareceu, em proveito de novo con-
teúdo,
o conteúdo que tinha.
A questão pôde ser posta
a posteriori:
os Estados antigos, os Estados modernos e os Estados recentes, como o soviético
e o fascis-
ta,
têm fins communs, immutaveis, ou ha
fins differentes nelles?
O mais que podemos apurar, se queremos ver
objectivamente, é que o Estado constitúe, por si, um
methodo,
uma technica social. Em cada um dos
Estados ha fins preponderantes:
em
alguns, são mais precisos do que noutros;
formaes aqui, substanciaes além. O Estado de fins nitidos, homogeneos,
coherentes, mais se accentúa nos nossos dias, com a Rússia, cuja univocidade submete toda a
actividade social
a
uma direcção rija e inamolgavel, e talvez seja
o
do Estado technico-syndicalista a surgir em alguns paises.
Como quer que seja, assistimos a um pro-
cesso
de clareiamento e
precisão
dos fins, se-
não
do fim primacial do Estado. Talvez a úni-
ca
solução para o problema da adhesão á nova ordem social esteja na confiança de
tender o Estado a fins precisos e finalmente
intelligi- veis.
No passado, vemos a convergência em tor-
no
de fins negativos ou de liberdades formaes. Hoje, a educação
scientifica, o pragmatismo sem doutrina que o trato da machina e a contemplação
dos seus resultados destillaram na alma humana, obrigam á pesquisa de métas
mais
positivas
e substanciaes.
Antes de chegar a tal descoberta, o pensamento
político e a technica jurídica tacteiam. A miséria de uma população crescente
de desfavorecidos suscita a questão social. Por outro lado, o
desencantamento das velhas formulas políticas empuxa ás revoluções. A classe mé-
dia
assiste á sua proletarização, e não sabe
onde
está o seu dever, — se prestigiar o mo- vimento
proletário, ou secundar o dos idealis- tas que crêem nas reformas de
constituição e
nas
substituições pessoaes de dirigentes. Todos procuram, por methodo seu, a
descoberta, e todos erram. Appellam, ás vezes, para a violência como
sustentaculo sufficiente ao plano
de
regeneração intellectual e moral da vida política. E' querer que a força possa
ser o cimento social.
A força não tém valor em si, não orga-
niza;
vale o fim, a que serve, ou nada vale.
Sem
fim que valha, esmaga, perturba, aggra-
va
os problemas, e cria a mentalidade oppor- tunista, irracional, incapaz de
construcção.
Onde, então, a solução ?
Onde o "ponto" em torno do qual
se faça
a
harmonia, a nova Lei, a nova Ordem?
Teremos ensejo de ver que está alhures
o
único feixe de princípios, em torno dos
quaes se possam aggregar os homens. Não a totalidade, porque a unanimidade no
estado actual, seria impossível; mas a grande maioria. Se accrescentarmos que
se permíttem as organiza-
ções de opinião e se assegura a
liberdade de pensamento e de coalição, a formula poderá
ter
o apoio de todos.
Satisfazer á maioria, pela descoberta de fins
precisos,
e obter o apoio de todos é o maximo que se ha de exigir a uma solução politico-social.
CAPITULO II
A Violência e o
Consentimento
A violência pôde -criar a
subordinação ef-
fectiva, a
ordem e a direcção. Pôde tambem
criá-las a adhesão continua â uma ordem e a
uma
direcção. A adhesão, por sua vez, ou re-
sulta
de crença que imponha, transcendentemente, a obediencia á lei, desde que esta
seja
a
própria direcção, o proprio fim do Estado,
ou
de movimento consciente ou inconsciente, em todo o caso orgânico, da própria
massa.
A democracia representativa, por si, não póde
criar a ordem e a direcção: funda-se no
que
decide a maioria, e a maioria muda; se é possível conceber-se ordem material
dentro da mudança, pelo compromisso de submissão ao votado, não é possível a
univocidade do Esta-
do,
a ordem intellectual, quando se varia de direcção.
1.
Só ha, portanto, dois meios de estabelecer-se
o Estado univoco:
a) A violência,
como fazem as autocracias, as ditaduras do proletariado, as ditadu-
ras
corporativas (corporativação de cima para baixo, pelo menos na época
formativa).
b) A convicção commum
(o conteúdo idêntico de querer), que congregue e, pelo fac- to "intuição
de vontade = verdade", realize
a
identificação do querido com o
certo,
da acção-carne do ideal e do ideal-esqueleto da acção.
Assim, o Estado que, por seu partido so-
cialista, proceder á mudança do individualis-
mo
pelo socialismo, motu proprio, dará exem-
plo
da identificação "liberdade = Lei", pela
impossibilidade
de se sentirem não-livres os individuos, pois foram elles
mesmos que qui- seram a Lei.
Quando a democracia representativa pre- tendeu
obter aquella identificação, foi victima de erro tremendo: não se obtivera,
ainda, a
Lei,
a verdade; e o principio "da discussão
nasce
a luz" pôde constituir proposição falsa. Nas discussões em que a
vontade
é, o que se expõe, são imperativos que se chocam, e só imperativos se podem
tirar de premissas no imperativo. Não se disse: os representantes reunir-se-ão para achar o que mais convenha
a todos, ou o que mais
convenha ao Estado; e
sim:
os representantes decidirão por maioria, presumindo-se que consultem os
interesses dos que os elegeram. Ora, não é certo que sempre
o
façam, e, quando o fizessem, a missão delles estaria longe de ser a procura do
bem do Es-
tado
ou de todos, porque os proprios eleitores queriam, ao escolher, coisas
differentes, pela diversidade mesma dos seus interesses.
2.
O conteúdo commum de convicção, que ligue
os homens, não póde ser "manter a ordem". Manter a ordem não é fim,
não póde
ser
fim; porque é principio improductivo. Fim
é
alguma coisa que se cria, que se vae realizar. Nos nossos dias e, menos claro,
a partir do se- culo passado, somente pôde ser fim social a solução
do problema economico e cultural de todos. Para que uma crença ou um pensamen-
to
seja social, "é preciso[2] que apresente aos
homens uma obra a executar, para a qual elles
se
constituam em ser collectivo, e na qual cada indivíduo, cada geração, tenha a
sua parte de trabalho, a sua parte de esperanças e de satis- facções".
Hoje, já ha desconfiança geral de todas
as
promessas legaes,
o temor de que tudo se reduza a coustrucções
jurídicas
sem apoio e
sem
actuação na vida. Vigia-se, nos resulta-
dos, todo o suporte
politico-social. As concor- dancias só se fazem sobre latentes discordan-
cias.
Mais trégua do que paz. No fundo, nen-
hum
dos movimentos interessados na effica-
cia
perfeita dos direitos renuncia á continui-
dade
ou, pelo menos, á crença na sua tactica. Inserir nas cartas políticas
novos direitos
e
continuar
na politica economica manchesteria- na levaria a um dos dois caminhos: o passo
atrás,
rompendo-se a confiança, o acordo so-
bre
o conteúdo politico-social; ou o passo á frente, aproveitando-se, para os
extremismos violentos, o trabalho já feito e a lição aprendi-
da
de organização politica.
O caminho é claramente apontado:
fins precisos
e economia dirigida ou de plano. Jun- tos salvam; separados, levam a situações
so- ciaes despoticas, ou só apparentemente duradouras.
3.
No momento, fixado o conteúdo politico-
social, a forma resultará da maneira pela qual
se
manifestará a adhesão geral. As estructuras traduzirão a harmonia estabelecida,
em func- ção da maior ou menor proporção dos diffe- rentes elementos
solidários. Desde as varian-
tes
eliminatórias do Estado, como a do anar- chismo, a do syndicalismo puro e a de Sorel,
até
as mais affirmativas do Estado, como a
do
socialismo centralista, todos os programmas podem girar em torno do Novos
Direitos do Homem. Este é o nosso problema.
Obtida a formula satisfactoria e, em consequencia,
a integração política, serão ellas
duradouras?
Sim, se se puserem em execução, median-
te
planos efficazes, taes direitos, revelados pela analyse social despersonalizada
e ao alcance de todos os reclamos das classes desfavorecidas (donde a dupla
origem: scientifica e subjecti-
va;
razão e vida). Não, se passarem ao rol
dos
textos abstractos, dos- chamados direitos
e
deveres moraes: romper-se-á a integração conseguida.
O jurista, de olhos viciados com as letras
e
saturado de proposições em claro estylo (não
era
sem razão que Flaubert tinha o
Code
Civil como padrão de
clareza!), passou a ver,
acima
e ao lado do nosso mundo, um outro,
que
seria o seu. Sem conseqüências fôra tal at-
titude
deformadora, se a vicia social não esti-
vesse
presa aos cordéis abstractos com que o
homem
das leis movia os seus fantoches, — na
especie,
os seus princípios. Resultou que con- fundiu
o logico com o justo, o justo do racio-
cinio
reflexivo e de elementos simples com o justo da vida, que é complexa. Quando,
por exemplo, dizia "todos são iguaes perante a
lei",
"ha perfeita liberdade de contractar",
não
via que a lei igual para entes desiguaes (physica ou economicamente) era uma
igno- minia, e que a liberdade de contractar, entre muita gente que tém fome e
pouca gente que vive do trabalho dos outros só significa estipulação
unilateral. Onde a liberdade? O ju-
rista
não viu nem quis ver. (Ainda agora, um
dos
mais intelligentes, o meu sábio collega na
Haya,
o professor austríaco Kelsen, levou
ás
ultimas consequencias o supramundo jurídico.)
Uma das mais curiosas construcções dos
juristas foi a de enorme cáes como anteparo
ás
intromissões do Estado onde a liberdade abstracta permittiu a
não-liberdade concreta, onde o mundo
logicamente justo do jurista transformou os seres reaes, concretos, em não-
livres. Basta citar a doutrina dos direitos adquiridos, a prisão por dividas,
o voto do representante contra o eleitor...
4.
O fracasso da democracia representativa
tinha de levar: ou á política irracional, instinc- tiva, da acção em si,
necessariamente suscep- tivel de direcções differentes, como tudo que vém do
inconsciente
(lembre-nos que Sorel aprendeu em von Hartmann), ou á medita-
ção
do problema central da finalidade do Es-
tado.
A primeira quer
methodos de guerra, de luta violenta, com menosprezo pelos metho-
dos
jurídicos que se empregam contra os criminosos. A segunda
pensa em arrebentar cer-
tos
princípios jurídicos contrários á felicidade dos indivíduos e á collectividade,
e proceder á destruição dos males sociaes, inclusive a mi- seria.
Como obter tal direcção? Em que
se póde apoiar
o homem de acção para tomar tal caminho e exigir que os outros o tomem?
Até aqui se recorria á legislação social
(objecto de mofa, por parte dos socialistas, e com razão). Agora, com a praxe
do direito
ao
trabalho, do direito á subsistência, da escola única, do direito á
assistência, e a consagração
sagração
parcial
em Constituições (o que mos- tra evolução do Direito constitucional
e,
ao mesmo tempo, da Theoria do Estado), o as-
pecto
da questão mudou. Não se trata de medidas de reforma social hypocritas;
trata-se
de
direitos concretos, que valem como
outra Magna Carta e justificarão reivindicações decisivas, além do mérito de
obrigarem a leva- rem-se em conta,
nos orçamentos, a alimentação, a casa, a
roupa, a medicina, a educa-
ção
e a diversão de todos.
As receitas, deante
de
taes despesas de caracter necessário, terão de ser,
necessariamente, mais sabias e mais sociaes.
No orçamento individualista de receita,
a
medida errônea que espalhava a miséria, ou que a deixava crescer, não tinha consequen-
cias
immediatas para os governos. Tão pouco,
as
que faziam escassear o trabalho ou aug- mentar o preço dos viveres. No
orçamento em que se tem de assegurar o direito á subsisten- cia, ao trabalho, e
os outros direitos, a medida erronea que serve á receita faz crescer a des-
pesa. O acto de governar, pela obrigação as- sumida pelo Estado, estabelece, de
si só, a necessidade de technica segura e a
selecção
dos governantes. A technica suppõe a syndicali- zação.
5.
O methodo da sciencia é o methodo de
ver
e prever, de ver e verificar se se pode
ver
o que se previu. Inductivo ou deductivo, pouco importa; ou nada importa, desde
que
a
ultima palavra se dê aos factos. Como quer
que
seja, o processo especifico do sábio é a ex- clusão de si, a existencia
despersonalizada, o surprehender o que se forma, o notar o que se repete, o
medir e contar. A utilização da sci- encia já
é outra coisa.
Lamentavel confusão transportou para o
domínio da acção o methodo do raciocínio puro e quis torná-lo methodo do
sabio
e do technico, do investigador e
do homem de acção. Foi um grande mal.
Houve, porém, outro maior. Como o ra-
ciocinio obtinha maravilhas em algumas sci- encias e permittia a abstracção
substantiva da Razão, levou-se ao terreno dos valores sociaes, dos valores
humanos e do Estado, o methodo logicista. Resultado: no Direito, criou-se ou
desenvolveu-se uma porção de princípios que, duramente
formaes, ôcos,
de excessiva generalidade, evidenciaram-se improficuos. O liberalismo juntou
coisas hetereogeneas: a liberdade individual e politica e a liberdade de
commercio e exploração. A liberdade econo- mica escravizou a maioria e a
continuidade de
tal
liberdade ameaça converter a sociedade em centenas de senhores e milhões de
escravos.
Para onde vamos?
Ou para a reviravolta prevista por Marx, ou para o novo Estado anti-individualista,
que desfaça sinceramente, energicamente, a obra sinistra da crescente miséria e
da injusta distribuição da cultura.
CAPITULO III
Novos
Direitos fundamentaes
Fóra da violência, que não pode durar
sempre, do subjectivismo irracional, de que
as
ditaduras sem finalidade precisa nos dão exemplo, só ha um meio de congregar
os espiritos, um só ponto em que se apoiem, para
que
a integração política se possa dar: este
meio
é a constituição socialista; o ponto de acordo social, os novos
direitos fundamentaes, em que se trace o contorno juridico do Estado, com que
se marquem as margens e a altura até onde possam ir as aguas que fluirão.
1.
Quaes são estes direitos?
O problema econômico e cultural
das clas-
ses
(note-se bem: economico e cultural, não só
economico)
vém em primeiro plano. Nelle
e
envolvido com elle, dependente delle, está o
de
descobrir aquelles direitos, — os únicos capazes de dar aos nossos dias
conteúdos suffici- entes de integração política.
Os povos têm procurado revelá-los. E' in-
negavel o esforço de alguns pensadores e tech- nicos em querer discerni-los;
mas a avalanche reaccionaria teima em querer que persista a divisão humana de
homens com direitos e homens sem direitos. As Declarações norte-americana
e
francesa não bastaram. Teremos ensejo de
ver.
Onde o direito ao trabalho? Onde o direi-
to
á subsistência? Onde o direito á educação? Onde o direito á assistência? Onde o
direito ao ideal, desde a diversão até as pesquisas scien- tificas? Só os
ignorantes confundem a situação resultante de textos que dizem "todos são
iguaes
perante a lei" com o direito a ser alimentado, a ter assistência e a ter
trabalho, ou
a
gratuidade da escola publica com o direito á educação, fruto hegeliano do
Século XX. Do direito ao ideal também não cogitam os vários systemas jurídicos
dos séculos passados.
Isto pôsto, cumpre saber se, com elles, se
obtém
a união humana, o novo conteúdo de integração política. E' exactamente o
assumpto deste estudo.
A solidariedade, de que se precisa,
para se prescindir da violência, só em torno de taes direitos
pôde occorrer.
Parece que o século não comporta outras
soluções. Onde o subjectivismo alogico (na Ita- lia, por exemplo) pretendeu
ficar no idealismo do acto, a realidade, veio suggerir menos des- dem pelos
fins precisos. Acabou-se por prestar attenção á necessidade de uma nova Magna
Carta. Em todo o caso, o modo de conceber os novos direitos fundamentaes não é
o mesmo, nem da mesma extensão, em todas as latitudes. O art. 23 da
Carta dei Lavoro
e o systema da Constituição soviética differem, e não nos parecem perfeitos.
O direito ao trabalho e á subsistência e o dever de trabalhar, por exemplo, são
correlativos; quem pôde e não quer trabalhar não tém direito á subsistência.
Mas a pre- ferencia aos membros de um partido quanto ao trabalho e á codecisão
não se justifica. Quanto
aos
cargos públicos de confiança, sim; em geral, de forma nenhuma.
Os contornos do direito á subsistência e
do direito ao trabalho começam no direito das gentes, porque, se o Estado,
quanto a determinado indivíduo, tém o dever de
recebê-lo
(nacional, apátrida restituido[3]), também tém o
dever
de lhe dar subsistência e trabalho. Os direitos respectivos existem, pois que
não póde
o
Estado obrigar outro Estado a ficar com o
dito
indivíduo. Certo, a existencia do direito á subsistência e ao trabalho ainda
hoje depen-
dem
do direito interno, mas é
indiscutível que, existindo num Estado taes direitos somente
para
os nacionaes e aquelles indivíduos a que não possa negar acolhida, não ha por
parte
delle
nenhuma infracção do direito das gentes, se os recusa aos estrangeiros ou aos
apátridas
a
que não esteja obrigado.
Os outros contornos são de direito inter-
no,
dependem da maior ou menor consistencia
e
extensão que cada povo queira dar a taes di- reitos. A technica dos nossos dias
tem, nesse campo, um dos seus futuros torneios de per-
feição.
Primeiro, a legislativa (constitucional, melhor diremos). Depois, a
administrativa, quiçá a de direito processual, devido ás acções contra o
Estado. Sobretudo, a technica financeira, orçamentaria, que obrigará a mais es-
treita
solidariedade e harmonia entre a receita
e
a despesa.
2.
O direito e o dever de trabalho, o
direito,
á
subsistência, á assistência, á educação e ao ideal: mas todo cuidado em não
despersonali- zar, em não lixar as individualidades criadoras, que são saliências
naturaes. Que a nivelação economica e a escola única não signifiquem em-
pioramente
da especie, e sim chão firme em que ascenda. Ascender em massa, pela hygiene social,
pela abastança, pelo conforto sufficiente,
pela
diffusão equanime da cultura, e em eminencias felizes, que são os genios. A
historia mostra que elles trazem nos ombros o seu tem-
po
e a sua fecundidade reage, profundamente,
a
favor do bem geral. Iguaes
possibilidades a todos.
O direito, tornado tessido racional, impeditivo
da própria renovação das leis e da acção criadora, reformadora, do Estado,
deixou que
se
percebesse o dilemma: ou a salvação do Estado, restituindo-se-lhe a funcção de
technica
do bem publico, ou insistir-se no
proposito de reputar eterna, immutavel, a velha principiolo- gia jurídica que
se crystalizara. Chegou-se a dizer: respeitar
ou
o direito, ou o Estado.
Não faltou quem elevasse o critério for-
malistico nomocratico, que caracteriza aquel-
la
attitude, a ponto de achar legitima a estricta limitação
perenne
da acção do Estado pelas
leis
de hoje.
Mais: de pôr o Estado a baixo da liberdade abstracta dos indivíduos e da propriedade
individual! Ainda mais: só o direito actual, com os seus principios, existe; o
Estado
é
abstracção, ou, quando muito, instrumento
de
garantia de tal direito! (Seria o máximo de dogma jurídico, — o formalismo mais
nefasto possível. Acabaria por ver arrebentadas todas
as
represas do direito e do proprio Estado.)
No tempo em que as leis eram concebidas e
lidas como regras concretas, como privile-
gios, igual concepção
mostraria os privilegia-
dos
e os não privilegiados, suscitando reivindicações claras. Hoje, não: o direito
que se crê eterno é constituído por princípios formaes, abstractos, ou por
preceitos muito geraes, ôcos, referentes a categorias jurídicas, e tal direito
assenta na "igualdade de todos perante a lei",
no
respeito dos "direitos adquiridos", etc. Só
se
viu o perigo de tal subjectivismo metaphy- sico da justiça quando já demasiado
graves os resultados sociaes.
Alguns povos reagiram, para salvar o Estado.
Mas nem todos viram que se tratava da crise de um direito, e não do Direito;
nem to-
dos,
saturados de racionalismo nomocratico, puderam observar-se a si mesmos, ver o
que
em
si se passava; nem todos cogitaram de descobrir o novo conteúdo de integração
política, o novo ethos, o principio
fundamental do novo direito. Quasi todos
tacteiam.
Na Inglaterra e em França, os políticos
reaccionarios proclamam a fallencia do ho-
mem
moderno, a impossibilidade de se resolver o problema da crise economica,
política e so-
cial.
Extremistas entendem que é o Direito (phenomeno e processo de adaptação social,
como os outros) que está em crise e por desap- parecer. Não. O que está em
crise é o direi-
to
romano, o direito medieval, o direito capita- listico, e não o Direito
processo social.
Cumpre achar a fórmula e construir o novo direito.
3.
Alguns (o exemplo mais typico é o da
Italia fascista), sob a influencia do irraciona- lismo violento de Sorel, do machiavelismo
so- ciologico e mathematico de Pareto e de umas tintas
de Nietzsche, rebellaram-se
contra a política inorganica do Estado esvaziado de
conteúdo
(liberalismo e democracia representativa subordinada a direito individualista
in- infringivel) e só depois, ainda ás apalpadelas, procuram a idéa, o
programma positivo.
Sem duvida, o Estado russo mostrou ser
mais consciente. A procedencia marxista assegurou ao homem de acção, ao
leader,
uma lam- pada com que avançasse nos corredores do desconhecido (todo futuro é
mais ou menos imprevisível). Não se deu o mesmo com o movimento italiano. O
que importava era avançar, apossar-se da Italia; e a arrancada fez-se no
escuro. Só mais tarde, cerca de sete annos depois, o fascismo consegue
descobrir alguns caminhos e Mussolini de hoje, através da es-
pessa
fumaça da acção de Sorel e de Pareto,
terá
de dar a mão, despercebidamente, ao jo-
vem
Mussolini socialista. Reencontrará a Lei?
O
futuro dirá. Se não a reencontrar? Estruc- turas não bastam. Tudo ruirá!
4.
O socialismo, partindo de certos direitos concretos do homem (note-se
a differença en-
tre
elles e os direitos abstractos dos seculos
passados), consegue extrair da visão supra- pessoal dos factos da vida, da
contemplação objectiva das relações entre dominantes e dominados, entre
classes favorecidas e classes desfavorecidas, um conceito de liberdade que
independe de ser sentida pelo ser que se diz
livre
ou não-livre. Taes direitos concretos são pouquíssimos:
1. O direito á subsistência, pelo trabalho
justamente recompensado, ou, se não póde trabalhar, por obrigação do Estado.
2. Portanto, direito ao trabalho, com a
obrigação do Estado.
3. O direito á educação, com a obrigação
do Estado.
4. O direito á assistência, com a obrigação
do Estado.
5. O direito á participação no conforto
material e espiritual (direito ao ideal), com a obrigação do Estado.
Já se tém, no
papel,
o direito de ir e vir e os mais que cabem no velho conceito de liber-
dade
physica, porém, no socialismo, têm de ser concretizados, por suggestão daquella
propria visão suprapessoal da liberdade, a favor do indivíduo ou das
collectividades.
Ora, de todos elles só os que por ultimo
se mencionaram foram revelados pelos séculos passados. Os outros apenas hoje
conseguem es- pontar nas Constituições e o direito administrativo e processual
para os assegurar absor-
ve
o espirito de quem quer que tenha a seu
cargo
a criação da technica de execução de taes direitos.
O contrapeso necessário delles é o dever de
trabalhar,
porém tal dever não implica nenhuma limitação á liberdade, desde que se conceba
nos seguintes termos: a infracção do dever de trabalhar corta todas as relações
obri- gacionaes do Estado para com o indivíduo.
5.
Resta o problema moral e jurídico da esmola.
Dir-se-á que a prohibição de dar esmolas
aos que se recusam a trabalhar constitúe vio-
lação
da liberdade dos que as querem dar. Se-
ria
a violação da liberdade de fazer e de não fazer, segundo o conceito abstracto,
vazio, que os juristas estabeleceram através de deducções (as mesmas que
justificariam o direito de suicidar-se e o de dispensar, em massa, trabalhadores)
; de modo nenhum, a violação da liberdade concreta, que o socialismo conseguiu
conceituar.
Tão pouco infringiria o conceito de liberdade
apanhado no dominio ethico, porquanto nada de
moral
se pôde colher no acto do ho-
mem
que dá esmola a quem não quer traba-
lhar,
nem de immoral na prohibição por
parte
do
Estado.
O assumpto leva-nos, por justaposição, ao
problema geral de esmolar. Todo elle participa do antagonismo entre a
piedade
e o direito á subsistência. Toda a piedade
suppõe a ausen-
cia
em alguém de meios ou qualidades necessarias á vida regular. A realização dos
direi-
tos
á subsistência, ao trabalho, á educação, á assistência e ao ideal torna sem
objecto a pie-
dade,
e implicitamente eleva tão alto o homem, que o dar esmolas constituiria acto
tão immo-
ral
quanto o do ricaço que, com o propósito de poder dar maior conforto, manda
roubar o fi-
lho
do camponês e o cria. O direito á subsistência
está para com o Estado e o Estado para com o direito á subsistência, como o fim
para
o meio e vice-versa. Diga-se o mesmo
dos ou-
tros
Direitos do Homem.
A subsistência, a hygiene e assistência á
mãe, ao recemnascido, á criança, ao adulto, têm de ser
direito,
direito executável contra o Estado. Fóra daí, nada feito. As panacéas de
obolos
para hospitaes, educação, asylos, não podem satisfazer a almas do Século XX. O
paternalismo passou. Seria querer que conti-
nuasse
a servilidade do trabalhador, do pobre.
O
trabalho é direito. A subsistência é direito.
A
assistência é direito. A escola e o ideal são direitos. Ao povo reclamá-los,
exigi-los. executá-los.
Para isto é preciso a Republica Socialis-
ta,
— que se adoptem, portanto, como fins do Estado, taes
Direitos do Homem. O dever de
trabalhar
e a Sciencia darão os meios mate- riaes. A machina a serviço do bem geral! As
descobertas e invenções a serviço do bem ge-
ral!
O homem, que hoje só deve trabalhar 7 horas, passará,
pela superproducção, a só trabalhar 6, 5, 4, 3 horas, e dia chegará em que o
Estado e as organizações syndicaes só pre-
cisem
de 1 hora de trabalho diário. O resto do tempo será para a elevação espiritual,
para a diversão e a fraternidade.
CAPITULO IV
Technica
Constitucional dos 5 Direitos
Até ha pouco os governos somente da-
vam
alimentos, roupa e remedios, por esmola, ou por gesto espontâneo de assistência
social (hospitaes, dispensarios, etc.), ou obrigados pelas circumstancias
(levas de famintos, mas-
sas
perigosas de sem-trabalho).
Nas Declerações de Direito e nas leis, es-
queciam-se
de inserir o direito ao trabalho,
sem
o qual, dizia Charles Fourier, todos os outros
são inúteis: "S'ils traitent des Droits
de 1'homme, ils oublient de "poser en príncipe"
le Droit au travail,. . . sans lequel tous les au- tres sont inutiles". Mas o utopismo de Fourier
_________
1. CHARLES FOURIER, Théorie des
quatre mouvements et des destinées generals, Paris, 1808, p. 270
acreditava
que taes direitos pudessem nascer sem o poder nas mãos dos que trabalham.
1.
Os nossos dias
exigem
o direito á subsistencia, direito constitucional (fundamental),
direito que vale perante o Estado, e não
pelo accidente da regra constitucional. A Constituição alemã — a despeito das
suas hesitações — consagrou o direito á
existencial
aos meios para subsistir. O Estado deve dar a todo ale-
mão
a possibilidade de ganhar a vida por um trabalho productivo (art. 163, alinea 2ª, 1a
parte).
Se occupação conveniente não lhe é indicada, prover-se-á a seu sustento
necessa-
rio.
Os pormenores são regulados por lei do Reich[4].
A consciência universal já desperta em
favor do indivíduo concreto. O direito das
gentes já procura apanhar as questões ditas sociaes. Mais algum tempo, e o
direito de subsistência entrará nos princípios do direito internacional commum,
como dever fundamental dos Estados. Os povos que não
estão aptos
a
assegurar o direito á existencia terão de ser olhados como susceptíveis de
tutela. O socialismo já revelou o direito publico á existencia;
já
o fez em alguns 'Estados, constitucional[5].
Terá-de
fazê-lo," em textos claros e insophis- maveis, direito-internacional dos
indivíduos6.
Nos povos onde o socialismo não assumir o
caracter de partido dominante e
único
(uni- partidarismo), o direito á
subsistência
tem de
se
apresentar sob a feição subjectiva e proteger-se de
acções,
para que valha. Onde se haja
chegado
ao partido único dominante, será a
propria machina politico-juridica que os assegurará, na entrosagem do seu
plano, da sua univocidade, do seu fim único, que é a
reali-
zação
de tal direito, do direito ao trabalho e
dos
3 outros direitos. Tal feição objectiva sup- põe a erradicação do
individualismo.
Vachkrot escrevia[6]:
"Quand la société
le
peut, elle doit intervenir pour aider les indi- vidus à sortir de leur
impuissance, de leur mi- sere, de leur immoralité. Mais convertir les devoirs de la société en autant de droits légale- ment
exigibles partout et toujours, voilà
1'erreur
et le danger". Em 1922, após repro-
duzir
o trecho, diziamos: ''Mas a posteridade revelou o contrario: a apparição legal
dos direitos subjectivos publicos já hoje desmente o receio de Vacherot". Asseguravamos
então
que,
para se conservar a ordem actual, as violências e os sacrifícios serão enormes
e inu-
teis:
"O individualismo terá de praticar maio-
res
violencias sociaes do que as commeteria
o socialismo. Os fins, a que chegarão, serão os mesmos[7]".
E' o caso da Italia, que matará o capitalismo com elle proprio, ou pelo
massacre.
Rigorosamente, os 5 Direitos do Homem como
simples direitos subjectivos são o mais alto grau de
justiça
a que póde chegar o individualismo[8].
Nas ditaduras do proletariado tomarão o caracter de
situações objectivas, segundo o linguagem do direito clássico. E' o
caso
da Rússia. Hoje, o progresso do direito publico e a economia de plano permittem
a
construcção
constitucional em que o socialis-
mo
envolva
a democracia e o liberalismo, que assim conseguem salvar o que tiveram e têm
de
bom. Noutros termos, os 5 Direitos do Ho- mem pódem ser
alicerce
do Estado e direitos subjectivos. Será a solução
entre
a Russia e a Alemanha e ao mesmo tempo entre a Russia
e
o presente, mas, sobretudo, solução nova,
que
dará ao Brasil pôsto considerável na his-
toria
contemporanea.
Certa vez dissemos que a Russia já disse
a
sua palavra, que a Italia disse, provisoriamente, a sua, mais em gesto do que
em phrase,
a
Alemanha continua o seu discurso, que se aproxima da peroração. Ao Brasil dizer
a sua.
Se
salvar o que deve ser salvo da codecisão (democracia), o que deve ser salvo do
liberalismo (liberdades individuaes), dentro da rija
constitucionalidade dos 5 Direitos, terá resolvido o seu problema social,
marchará para o futuro, rico e admirado, e os outros povos da America Latina o
imitarão.
2.
FOURIER já defendia[9] o direito a um minimo vital, o
Existenzminimum dos nossos
dias,
como um "direito natural". Em La Pha- lange de 7
de maio de 1841, escreveu VICTOR
CONSIDERANT: "L'homme a
le droit au pain quotidien ou plutôt à ce Minimum proclamé avec raison par
Fourier comme une dette de
la société envers tous les membres". Seria o
"droit de 1'homme au pain quotidien", titulo
do
artigo.
Proudiion disse,
referindo-se ao trabalhador: "Il n'a pas droit à un humiliant Mini-
mum;
il a droit à tout son produit, ã 1'intégrité
de
son droit, ou il n'a droit à rien. Tout hom-
me a
le devoir du travail afin que tons aienl
droit
aux produits du travai!".
No Manifesto Marx-Engels de 3 de março de 1848, diz-se: "O
primeiro direito do homem é o direito de viver. O trabalho é uma das condições
da vida do homem; a sociedade deve trabalho a cada um dos seus membros,
e
os meios de existencia aos que não pódem trabalhar".
Na Assemblée
nationale,
os arts. 7 e 132 do Projecto de Constituição versaram sobre
os
direitos ao trabalho e á subsistencia. Glais-Bizoin proclama, então:
"(La Repu-
blique)
reconnait le droit de tous les citoyens
à
1'instruction, le droit à l’existence par le travai! et à 1'assistance".
Se bem que do mesmo anno, cumpre não confundir o pensamento do Manifesto e o
dos constituintes franceses: no primeiro, o direito á subsistência decorre da
própria estructura do Estado univoco, então
só
ideado; na Assembléa, a affirmativa de tal direito não implica a revolução
social.
Em quanto se pediam os direitos ao tra-
balho,
á subsistencia e á assistencia, os gover-
nos
e instituições particulares intentavam medidas de philanthropia, — desde a
esmola até
os
hospitaes. Esmolas insufficientes e hospi- taes insufficientes. Do lado do
Estado nenhu-
ma
obrigação.
O liberalismo veio fortalecer os que se
recusavam a assignar os direitos á subsisten-
cia
e ao trabalho. Os proprios titulos dos li-
vros
durante o Século XIX e começo do novo, são expressivos: desde o
De la Bienfaisance publique do Barão de Gérando (Paris, 1839),
até
Solidarité de Léon Bourgeois (Paris,
1896),
Paris qui mendie, les vrais et les faux pauvres, mal et remêdes de LOUIS Paulian, (Paris, 1893), o livro de Münsterberg sobre
a Assistência, os Modern Methods of Charity
de Ch. Richmond
Henderson (New York, 1904), o Que fazer? de Leão TOLstoi, o Assistance publique et charité
privée de M. Beaufreton (Paris, 1911), La Protection
des Faibles de Rondel... e tantos outros.
Isso
quanto á subsistência. Quanto ao traba-
lho,
o esforço, as meias-medidas, as bôas intenções da
legislação social
e o fracasso que vemos por todo o mundo.
Legislação social! Legislação do trabalho!
Sabemos bem o que é isso. Nem tudo,
nella,
é perdido, mas bem poucos preceitos funccionam satisfactoriamente e a própria
es- tructura se choca com o Estado capitalista.
Elle
a faz, sob pressão; porém com o intuito prévio de fraudá-la.
Uma das conseqüências psychicas do capitalismo
é a indifferença dos indivíduos do centro, em que se trabalham as cifras, pela
sórte
dos outros indivíduos.
Frieza que con-
frange.
Não vêem os detentores dos meios de producção,
por irás
dos números, das ordens
de
economia, de dispensa ou de reducção de salario, o que ha de vivo, o que ha de
humano,
o
que ha de almas e de
corpos attingidos.
Ora, o que se deve querer é exactamente
o
cómputo do vivo, do humano, dos corpos e
das
almas, antes
de qualquer outra finalidade das cifras, porque as cifras, em primeira plana,
devem
tocar ao Estado, elle é que as escolhe
e
as fixa, e o Estado não pôde ter outro fim
que
assegurar a todos a subsistencia, pelo
trabalho
(ou como direito do homem, quando o trabalho falte ou o indivíduo não possa
trabalhar), e dar a todos os entes humanos os meios de
assistência
e de elevação espiritual (direito
á
educação e direito ao ideal). E' daí que se tem de partir.
Assegurado o nivel — sempre mais alto! —
de alimento, de roupa, de casa, de educação
e
de hygiene de todos, cumpre separar: a) a
parte
do excedente de producção que se des-
tina
a engrandecer o país, dotá-lo de melhores estradas, de melhores meios de
transporte, bi- bliothecas, museus, hospitaes, obras publicas;
b)
a parte destinada á defesa e provisão social nos maus dias.
Em 1922, escrevíamos[10]: "O
direito á vida implica
a assistência obrigatoria como produ-
zirá
outras medidas. E não se diga que é me-
taphysica
a natureza delle; poucos vivem tão nitidos na consciência social e poucos têm a
defendê-los tão poderosas forças congregadas. Grande parte das verdadeiras
lutas politicas fazem-se em torno delle. A' medida que elle se desenha, se
exterioriza e ganha formas de evidencia lógica e scientifica, surge o dilemma
do Estado: realiza-me, ou morrerás. A reacção
será
a agonia do listado pessoal. E a esphyn-
ge
fita nelle os olhos ameaçadores. Somente existirá o direito á existencia,
quando cada um deva receber — desde o dia do nascimento até
a
morte, e portanto (por intermédio da mãe e
do
pae) desde a concepção — os cuidados tendentes a lhe garantir, na medida da
efficacia
da
sciencia, a relativa preparação para a vida: saúde intra-uterina, assistência á
maternida-
de,
pediatria, vestes, alimento, habitação, in- strucção. Se qualquer sociedade
não vê e não evita
a morte dos indivíduos que aos poucos
se
debilitam por falta de agasalho no inverno
ou
de comida durante calamidade de clima ou escassez de trabalho, não póde ella
pretender
que
assegura o direito á existencia. Direito á existência, direito ao trabalho,
direito ao pro- ducto do esforço e outros são formas
previs-
tas após o
conhecimento das circumstancias actuaes e dos seus resultados, de maneira que
o
legislador tém de experimentar processos tendentes á effectivação delles e não
somente
os
decretar, pois que isto nada resolveria".
3.
O direito ao trabalho representa, para
alguns, a zona neutral entre as
doutrinas extremistas e o individualismo; mediante elle,
o
proletário e o não-proletario pódem dar as mãos[11], fundindo as
classes. A recusa delle é uma provocação, um desafio. (O direito ao trabalho
sem ser em Republica socialista, será simples realização
verbal.)
Principios abstractos que pareçam sim-
ples
preceitos de programas, de direito ob-
jectivos,
sem acção, sem a subjectividade (só ella é
completamente efficaz, onde o Estado
não
é univoco, mas já de economia dirigida)
não
resolvem. Discutiu-se isto, em 1884, quan-
do Bismarck, erradamente, invocou como di- reito
individual trecho do Landrecht prussia-
no
(Parte II, tit. 19, §§ 1, 2). Regras que se dirijam á administração não bastam.
E pre-
ciso
que se declare o direito subjectivo individual, effectivamente
executável contra o Es-
tado
Na theoria, o direito ao trabalho appa-
rece como subsidiario: só se manifesta
quando falta o emprego com que o individuo se sus-
tente.
São legitimados á acção todos os que
são
capazes de trabalhar e, sem culpa, não
tem
trabalho. Aqui surge a questão da nacionalidade ou da
habitação:
ou só se reconhece
tal
direito aos nacionaes (cidadãos), ou aos nacionaes e aos estrangeiros que
habitam o
país.
Não nos parece que o limitar-se aos nacionaes resulte da natureza das coisas,
como
quer Singer1. Nem o direito ao
trabalho e á subsistência devem ser condicionados á nacionalidade.
Aliás, no direito das gentes, ha a solu-
ção
para a entrega dos estrangeiros ás suas pa- trias e dos apátridas aos Estados a
que devem caber, quando outros Estados não os queiram.
Quem é obrigado a executar a
obrigação de direito publico correspondente ao direito (subjectivo) ao
trabalho? Já vimos: o Esta-
do.
Administrativamente ou constitucional- mente, procede elle á
repartição da competencia; então, poderá caber á communa ou municipio,
á província, á collectividade membro
da
Federação ou ao proprio governo central.
A
solução que mais se recommenda é a de ca-
ber
á communa e, suppletivamente, ao centro, ao Estado.
Trata-se de direito fundamental
e
tudo indica que os direitos fundamentaes
não
devem ficar á mercê das communas, nem das provincias.
_______________
[1]
Rudolf Sixger, Das Recht auf Arbeit,
Jena, 1895,
p. 77.
Sabido quem é
devedor,
vejamos em que consiste o direito.
Objecto do direito ao trabalho é o
offere- cimento de trabalho, cuja contraprestação seja sufficiente
para o sustento, em senso largo. Resta saber se o Estado é obrigado a prestar trabalho
da mesma, natureza
que aquelle que o indivíduo perdeu (droit au travail professio-
nel,
segundo Proudhon e LOUIS Blanc), ou
a
prestar trabalho em geral. O Estado dos nossos
dias deve ser cada vez mais technico:
a
melhor solução é a da carteira em que se mencionem a profissão
optima
e as affins.
Para assegurar o trabalho, ou o proprio
Estado cria os serviços e emprega os sem-tra- balho, ou procura o trabalho
entre os particulares e o distribúe. De qualquer modo, se o trabalho
escasseia, tem o Estado de recorrer
ao
primeiro processo ou manter o sem-traba- Iho. Se continuar capitalista o
Estado, os patrões, que dispensam operários sem razoes suf- ficientes, ficam
sujeitos a penas duras. A obrigação de manter o sem-trabalho póde ser prevista
pelo seguro; mas o tempo mostrará a sua
precariedade.
Na Alemanha, a manutenção (Erwerbslosenfürsorge) constitúe
direito publico subjectivo, dotado de acção[12].
Os meios technico-financeiros para assegurar
a execução do direito ao trabalho são
os
seguintes: a) o seguro contra a falta
de trabalho; b) o controle do trabalho e da sua
distribuição por parte do Estado; c) os servi-
ços
públicos e as colonias agrícolas e indus- triaes para os sem-trabalho.
Todos são falliveis.
Só o plano geral de organização do
trabalho e de repartição dos productos póde pro-
ver
á obrigação do Estado com segurança. Só
o
plano geral
póde evitar o crescimento da Re- serve-Armee, só elle retardará
o dies irae marxista ou
poderá encontrar fórmula fundidora
das
classes, permittindo o equilíbrio e, pois, a solução provisoria.
Em todo o caso, o Estado que assegure
os
5 Direitos, irá, deslizantemente, em Paz e Ordem, para a solução duradoura.
Não a servilidade mentirosamente amparada,
mas a dignidade do trabalho é o que se quer. A plutocracia tenta manter
aquella; o socialismo quer reinstituir a dignidade, que a Revolução francesa
criou e o capitalismo escamoteou aos trabalhadores.
4.
Proudhon, no art. XIII do
Projecto de Constituição, só se refere ao ensino
primario gratuito.
Allude á educação profissional, sem ser explicito quanto á gratuidade. Hoje,
devemos considerar essenciaes a uma constituição
do
Século XX a gratuidade, a
unicidade
e a obrigatoriedade da escola
primaria e do ensi-
no
profissional. O minimo exigido de luz e o minimo
desejado
de efficiencia social. Outro- sim, a gratuidade de todos os outros cursos.
O
ensino profissional exige ensino acima do primário, algo
de primário superior, de modo que eqüivale ao curso secundário. Por outro lado,
o curso secundário pôde habilitar, por si só, a certas profissões: é, por
exemplo, o
"curso
profissional" dos professores prima-
rios;
se bem que prefiramos a unicidade do
professorado,
todo saído do curso superior.
O curso primário para todos, o ensino
único, é o ponto de encontro do socialismo com a democracia. (Comprehende-se
que Napoleão, querendo intercalar, entre o povo e a aristocracia, os
"cabos intellectuaes", que preparassem a classe rustica á
disciplina, como já foi dito, quasi só se preoccupasse com o curso secundario.
Foi um dos seus erros.)
A democracia incentivou o ensino primario,
para ter eleitores, mas o capitalismo agra-
rio
evitou que se generalizasse a escola. No Brasil, permittiu-se "assignar o
nome". Obti-
do,
o eleitor está feito. Tal o compromisso en-
tre
o senhor rural e o político, entre o capitalismo agrario e o regime
representativo. O
dono
das terras irá ao curso secundário, tal-
vez
ao superior, ou entregará a fazenda aos irmãos, para ir occupar as funcções
juridicas, politicas e ecclesiasticas, que conservarão o Brasil mais ou menos
como fôra no Século XVIII e fim do Século XVII.
Tudo isto aggrava a intranquilidade, as
injustiças sociaes e, pois, a luta.
A escola tem de ser para todos. Entre todos,
e não entre os que tiverem dinheiro para
se
instruirem, é que se devem recrutar os dirigentes. A igualdade
no inicio
e no fim; a desigualdade só
como meio, pelo indispensavel
valor technico e organizador.
Diz-se que a escola única, para todos, nivela,
primariza
os homens. Não é verdade. A escola fundamental gratuita, obrigatoria, uni-
ca,
dá alimento espiritual a todos: e a selecção será feita, sem injustiça, sem a
grave injusti-
ça
de partirem do póste milhões de corredores
e
alguns de cem metros ou milhares de me-
tros
adeante. A escola profissional gratuita e obrigatoria, que é a de trabalhos
manuaes, de technicos, de professores (abrangendo, então,
o
secundário ou este e o superior), prepara os individuos para as funcções de
producção. O curso secundário e o superior
gratuitos
e facultativos a todos permittem
o accesso á scien- cia, á cultura, por parte de quaesquer retarda- tarios.
Deve ser
gratuita
a educação secundaria? Os capitalistas de todas as especies, os credos que
lutam contra, a elevação á sciencia, respondem que não. Só tém utilidade onde
as capacidades são excepcionaes, sustentam outros. Seria caro, e não
compensaria o desperdício
de
dinheiro, querem outros mais. Se dermos instrucção secundaria a todo mundo, não
será possível encontrar operários e trabalhadores ruraes, advertem outros.
Tudo isso é falso. Muitos dos actuaes operarios
têm instrucção secundaria. Melhor operario é o mais esclarecido. Se todos fos-
sem
instruídos, melhor seria. Ao terminar o curso primário, o seleccionado deve ter
a
opção:
entrar logo no curso profissional, ou ingressar no secundário. Este será
sufficiente para a sua profissão, caso mereça ser profes-
sor,
ou constituirá alicerce excellente para o curso profissional. A distribuição
será assaz facil em systema socialista, devido á igualdade ou diminuta
differença dos salarios. em quan-
to
ha salarios.
A certa idade começa o trabalho para to-
dos:
os que ficaram em determinado gráu aí permanecem, salvo o direito á cultura
livre.
Resta o problema dos cursos superiores. As
vocações extraordinarias logo se manifestam. O impulso criador grita. Mas o
proble-
ma
não deve ser pôsto sómente para os seres excepcionaes, para os altos indices de
valor artistico, scientifico, politico, moral, ou eco- nomico. Tão pouco para
os que, á certa idade, desistem de proseguir e querem, ao fim do cur-
so
primário, ou do curso secundário, começar
a
trabalhar; ou para aquelles cuja inaptidão de ascender no estudo por si mesma
se revela.
A gratuidade é essencial, de baixo até em
cima. A escola primaria deve levar ao curso profissional, directa ou através do
curso se- cundario. Aliás, no curso profissional directo
ha
sempre alguma coisa de secundário que facilite ou valorize o ensino technico.
Sem gratuidade não ha direito integral ao saber. Mediante a gratuidade em
todos os gráus, — em todas as portas, — evitam-se a irreparabilida-
de
das notas injustas, o sacrifício dos retarda-, tarios (ás vezes um delles se
chama Pasteur),
a
irrealizabilidade do ideal que chegou fóra
dos
períodos didacticos, ou após outro, que se abandonou.
A selecção só pelos
exames, pelos concur-
sos,
é defeituosa. Cria a luta, a competencia,
em
vez da collaboração, da solidariedade e leva, ás vezes, a injustiças. A
selecção scientifica poderia racionalizar a solução, mas o augmen-
to
de alumnos não corresponde ao de gastos, portanto: não justifica a restricção á
liberda-
de.
(Aqui, socialismo, liberalismo e anarchis-
mo
estão de acordo; o capitalismo, como sem-
pre,
defende o Mal.) O que é preciso é que,
ainda
estudando ou já não estudando, a uma
certa idade (19, 20, ou 21
annos, por exemplo), TODOS comecem a trabalhar, a
produzir.
Diz-se que, se todos tiverem, todos abusarão.
Não é verdade. Primeiro, todos não te-
rão
tudo que quiserem (thema anarchista),
mas
o que se assegura a todos, conforme da-
dos
de lugar e tempo. Segundo, em muitas cidades, a agua é de provisão illimitada,
e
são rarissimos os que deixem abertas as torneiras.
Se todos tiverem direito á educação
secunda-
ria
e superior, nem todos irão até lá; por si mesmos,
ficarão na escola primaria e na pro-
fissional,
obrigatórias.
5.
Falámos da educação primaria, da secundaria
e da superior. E os meios para a pro- ducção artistica e scientifica?
Socialismo sem grandes laboratórios, sem campos de experi- encias, sem centros
de aperfeiçoamento e de producção artistica (materia com que traba-
lhe,
instrumentos, museus, exposições), é coi-
sa
que se não comprehende. Um pouco de se- lecção, para os ingressos, mas, em
principio, a liberdade e a
facilidade dos meios para a producção artística ou scientifica. E' o
direito ao ideal, assumpto de outra monographia.
Não basta que
todos
vivam sã e commo- damente; é preciso promover a progressiva elevação do nivel
espiritual. A Sciencia, a Arte
e
o valor moral têm de ser preoccupação de
toda
doutrina socialista. Deve ficar assegura-
do
o bem estar de todos, — subsistência,
rou-
pa,
casa, leite, remedios, etc., — para que pos-
sam
ter tempo e
meios
para a instrucção, para
a
educação physica, como para o gozo da arte
e
da sciencia, a criação artística e a criação scientifica.
(Krapotkine queria que o trabalho manual e o
intellectual fossem unidos: escrevo o livro e eu mesmo o componho e imprimo. Se-
ria,
individualismo de esquerda, e não socialismo. No syndicalismo e no socialismo
gre- mial, a Federação do Livro resolveria. Os di- gentes do
Estado, no socialismo burocratico, decidiriam. A melhor solução é a da
liberdade
de
impressão em principio e, como processo
não-absoluto, a selecção. Livro recusado póde ser impresso, a pedido do corpo
de trabalhado-
res
a que pertença o autor, ou de outros trabalhadores, desde que seja assegurada,
por esse modo, a metade ou parte das despesas.)
O socialismo tém de admittir e assegurar
a
liberdade para o impulso criador. Facilitar
a
producção artistica, e deixá-la livre, expan-
siva,
affirmativa do eu, como especificamente
é.
As suas vantagens, em relação ao individualismo capitalista, são evidentes: em
quanto,
neste,
só uma pequena minoria se educa e tém
os
meios para a producção artistica ou scientifica, occorrendo que, na camada
favorecida pela ascendencia ou circumstancias outras do systema capitalista,
muitos não cogitam de
arte,
nem de sciencia, o socialismo dá educa-
ção
possivel a todos
e os meios de producção artistica e scientifica.
Toda organização e todo plano geral de um
Estado socialista deve tender a diminuir
as
horas de trabalho de todos, para que lhes reste, crescentemente, o tempo para o
divertimento, o aperfeiçoamento individual, o pra-
zer
artistico ou de leitura, a actividade doutrinaria, a
criação
de arte ou de sciencia.
Realizar o
plano geral de producção-con- sumo como alicerce indispensável ao Exce-
dente
da Producção quanto ao Consumo, afim de educar
todo o país,
criar aulas profissionaes
e
de arte,
diffundir noções e methodo scienti- cos, elevar o
tonus
moral do homem e tirar dos milhões de hoje e de amanhã o
máximo
de rendimento economico, artistico, scientifico e moral, com o
minimo
de esforço.
CAPITULO V
Conclusão
Vimes que o ter
fim
único, claro, é condição necessário e
sufficiente
para que o Es-
tado
saia da terrível crise em que entrou. Vi-
mos
mais que só os 5 Direitos fundamentaes pódem constituir o
fim único.
A execução dos 5 Novos Direitos põe o Estado
na linha socialista, pela qual marcha-
rá,
sabendo como vae e onde vae a cada momento, em continua avançada, que tirará a
razão
de ser dos movimentos catastrophicos. Fóra daí, não ha como evitar o rôlo
compres-
sor,
das reviravoltas, o sacrifício de milhões
de
vida que toda Revolução sangrenta custa.
Com os 5 Novos Direitos e consubstanciado
nelles, o Estado permittirá a codecisão (discussão dos
pormenores politicos, democracia) e as liberdades individuaes que o "revo-
lucionarismo
de direita" entende sacrificar
para
os seus propositos inqualificaveis.
1.
A univocidade do Estado é
perfeitamente assegurada e só se póde assegurar se lhe der-
mos
a finalidade de realizar os 5
Novos Di-
reitos
. Devem constar das Constituições e ser
a
base mesma em que ellas assentem. Só elles pódem constituir o
'conteúdo
de integração,
que
os scientistas de hoje buscam, para as no-
vas
cartas políticas.
O fim único póde permittir
que se conservem as conquistas do passado quanto á liber-
dade
individual, physica e de
pensamento,
e a propria resolução majoritaria (democracia) quanto aos pormenores
interiores
dos 5 Direi-
tos
fundamentaes.
Socialismo que
envolva
a Democracia, e não envolvido por ella.
Republica socialista, e não Republica em que
um dos partidos
seja socialista. Na Constituição,
por exemplo, de-
ve
ficar firmado que a escola primaria e profissional sejam gratuitas e obrigatoórias.
A dis-
cussão,
— interiorizada, como foi dito, —
póde
versar sobre o processo de admissão a
uma
ou outra profissão, a passagem directa ao curso profissional ou ao secundário
e, depois,
ao
superior (profissional mediato). E' isto o
que
denominamos socialismo continente em
vez
de socialismo um dos conteúdos.
A democracia, ou codecisão,
dentro do fim preciso, dos 5 Direitos, perde todos os seus inconvenientes.
Portanto, os 5 Direitos salvam
a
democracia, hoje entre dois fogos: o dos reaccionarios, o das esquerdas
extremistas.
A liberdade de pensamento e as outras liberdades,
desde que não firam os 5 Direitos,
os verdadeiros asseguradores da
Liberdade,
ficam incolumes aos dois fogos que as ameaçam: o dos reaccionarios, o das
esquerdas extremistas.
Em vez de ser a democracia a caixa em que
se metem o socialismo e outros partidos, a caixa é socialismo e dentro delle,
nunca fóra delle,
é que se exerce a actividade opinativa.
A
univocidade não será sacrificada pela liberdade de discussão. Duas figuras
esclarecem:
A solução seria
equidistante
da solução russa, da solução alemã de agora, evidentemen-
te
insufficiente, e da italiana; mas, technica- mente, superior ás tres.
Os 5 Direitos permaneceriam, em qualquer das discussões, como o fim do Estado, de
modo que a democracia não seria só Rousseau, mas Rousseau
e Mon- tesquieu, não só Vontade,
mas Vontade e Verdade, não só Liberdade, mas
Liberdade e Lei.
Outro exemplo.
Fixado o minimo vital, realizadas as condições
para a plena execução dos 5 Direitos fundamentaes, poderá ser adoptado o
salario unico, ou dois salarios, ou os tres salarios, ou
a
extincção dos salarios para todos. O que é essencial é o que
envolve,
o socialismo, os 5 Direitos
fundamentaes, que se têm de executar antes de qualquer outra coisa.
O Plano tém de partir delles. Quanto é
preciso para que todos comam, tenham
roupa, casa, moveis? Tanto. Lance-se! Quanto é preciso para que todos os individuos
em idade escolar tenham escola primaria gratuita e única?
Tanto.
Lance-se! Quanto é preciso para que se dê a todos o ensino profissional
gratuito? Tan-
to.
Lance-se! Quanto é preciso para que se facultem a todos o curso secundario e
superior, absolutamente gratuitos? Tanto. Lance-se! Quanto é preciso para que
tenham livros e instrumentos de ensino todos os individuos
em
condições de aprender? Tanto. Lance-se! Quanto é preciso para que se assista, hygieni-
ca
e medicamente, a todos os que precisarem? (As estatísticas, a respeito, também
são fa-
ceis.)
Tanto. Lance-se! Quanto é preciso para que as pesquisas scientificas e outros
ideaes humanos, desde a criação artistica até o
sport? Tanto.
Lance-se!
Depois disso resta perguntar: Que é preciso
para augmentar e aperfeiçoar os transportes; enriquecer a nação, evitar os
effeitos
das
calamidades imprevisíveis ou previsiveis? Tanto. Lance-se!
Só a racionalização da
producção
e do consumo, não
separadamente, mas em funcção um do outro, poderá pôr o Estado em condi-
ções
de cumprir o objectivo constitucional. A economia de plano e a educação de
plano.
Na parte política decidirão os partidos
nacionaes, de idéas necessariamente nitidas, com mandato imperativo.
Discutiriam a direi-
ta,
o socialismo, o communismo, mas respeitados os 5 Direitos do Homem, alicerce
constitucional inviolável.
2.
Que se deve fazer para que não comprometam
os 5 Direitos do Homem?
Impedir que haja enriquecimento pela
conquista, pela usura e pela servilidade do trabalho, e permittir ao espirito
technico todos os meios para o seu desenvolvimento, afim de que se não
difficulte ou empeça a execução do programma basico, que é o dos 5 Direitos do
Homem. Regime do trabalho, e não
regime da força,
ou da dominação plutocratica. A ma- china a
serviço do bem publico, e não como multiplicador dos gozos de uma minoria des-
frutadora. Racionalização, não só das empre-
sas, nem só da producção em geral, mas da
producção e do consumo, — da ordem social, emfim.
Evitar que, por
trás de um titulo de propriedade, o individuo se opponha ao bem de todos, ao
progresso; mas deixar bem claro que
é falsa, desleal, a campanha que se faz
contra
o socialismo, — a de que elle tira a casa,
os moveis, os livros, os objectos de arte, o vehi- culo de uso pessoal, dos
individuos. Praticamente, as revoluções só políticas é que expro- priam os
adversarios. O socialismo só se pre- occupa com os
meios de producção e elevação
material e espiritual e só a estes procura submeter ao
plano geral de producção e consumo.
Aproveitar todas
as intelligencias, por-
que valem mais do que as proprias
riquezas naturaes: a escola única, gratuita, prepara o caminho da
igual possibilidade a todos e do maior
rendimento possivel dos genios e dos talentos.
3.
O
mundo de hoje tem de ser de gente
que trabalha.
A solidariedade humana manda que se sustentem os que não podem trabalhar;
e o bem publico exige que se eliminem ou
se afastem os parasitas.
A chefia aos
technicos, e os technicos sabem que a hereditariedade não justificaria que
a direcção das fábricas e usinas coubesse
aos seus filhos, necessariamente, ou por vontade sua, e que a competencia não póde
ficar á mer-
cê da força ou dos detentores dos meios de
pro- ducção.
A
realidade dos valores, e não a moeda e
os rolos de papel empilhados em cofres particulares, tem de decidir da
organização da pro- ducção e do consumo. As oligarchias plutocra- ticas, cujos
dedos prendem os representantes nacionaes, para assenhorear-se do Estado,
quaesquer que sejam as divergencias
partida- rias, servem-se delle para perseguir os
proletarios e os technicos de mentalidade livre, mas
estão sempre promptas a negar a
intromissão
do Estado na organização da vida.
Illogismo, sob o qual jaz a logica do
lucro voraz. No momento, querem transformar o Estado em
li-
beral,
economicamente, e não liberal
quanto
ás opiniões, á reunião, á syndicalização e
á propria faculdade de ir e vir.
Exactamente o
contrario do que devia
ser o liberalismo: liberdade individual, de reunião, de pensamento, de
aggregação, e relativa liberdade economica. A principio, juntou-se á liberdade
individual e política a liberdade economica, de origem e situação differentes;
ago-
ra, querem-se eliminar as verdadeiras
liberdades, para que só prevaleça a contraria ao
bem publico.
Gritemos: não é
possível! o Homem é livre!
4.
O Estado terá de
ser coordenador
das forças sociaes e previdente; para isto, ha de
ser
technico e
scientifico. Dentro delle e em
contacto ou funcção com elle devem
achar-se
os technicos e os
demais trabalhadores.
Alguns crêem que o
parasitismo se elimina automaticamente pelo funccionamento
das entrosas syndicaes. Discordamos. Não
basta. O funccionamento não será possivel sem
que se cortem as consequencias do parasi-
tismo. A organização syndical prepara a
luta; porém, em quanto a victoria não vém, a corrupção, as leis sociaes
enganosas, as revo-
luções provocadas para que abortem, mante-
rão o parasitismo, interessado, por isto mes-
mo, em taes expedientes retardadores. O
syn- dicalismo ou é organização vazia de
doutrina, ou marcha com a idéa socialista,
que o encha,
ou com a concepção anarchista, que confia
no milagre
da greve geral extinctora do Estado.
A primeira forma é
insufficiente e perigosa. Os fascistas espreitam o momento. A terceira é mais
ou menos louca. Só a socialista serve.
O Estado não póde
pretender a direcção metaphysica, espiritual. A questão religiosa
não deve intervir nelle. Mas ninguém lhe póde
negar, hoje, a
autoridade e a
responsabilidade no assegurar o
direito á subsistencia, o direi-
to á educação primaria e profissional,
gratui-
tas e obrigatórias, secundaria e superior,
gratuitas e facultativas, o direito á assistência e o direito a um ideal
(scientifico, artistico, desportivo, etc. ) . Ao lado de tal funcção
activa, positiva, technica, cabe-lhe
assegurar a liberdade de cada um, quer dizer — de se oppôr a toda tentativa de
dominação physica, econo- mica e espiritual por parte de alguém ou de grupos.
E' o instrumento de coordenação e de previsão economica e cultural. O seu fim,
donde a sua univocidade,
é dar execução áquel- les direitos, para o que todos os meios techni-
cos devem ficar ao seu alcance. Todos os
seus actos têm o mesmo sentido, a mesma finali-
dade, que
é o bem geral, o bem de todos.
Mas o bem de
todos, o bem geral; concre- tamente
concebidos nas expressões daquelles direitos
insophismaveis e
exigiveis..
Fóra disso, não ha
Paz. não ha Ordem,
não ha Lei duradoura. Marcha-se, aos solavancos,
para o desconhecido.
5.
Toda dilação em
resolver o problema social é aggravá-lo. Nenhum país evitará a Revolução, se
quisér pará-la a tiros de canhões:
a idéa está á frente, porém, tambem, por
trás
dos canhões. Só a sinceridade em querer
começar a igualização das classes póde evitá-la.
Quer dizer: ou a estrada recta, avançando
para os horizontes recusaveis; ou o salto
mor-
tal, entre os penhascos. Ou as mãos dadas,
symbolo do Direito; ou a luta cruenta, mais terrível e mais abysmante onde
maiores forem
as resistências e a ignorancia das massas
sof- fredoras e das classes dominantes.
Só ha um meio de
evitar o desfecho sangrento, violento, esmagador, da questão social,
é mostrar como se póde resolver, e resolvê-la.
O dilemma apparece-nos em toda a sua niti-
dez. Não ha atalhos possíveis, todos os
subterfúgios são inúteis. Não se trata só de um problema de psychologia de
massas, mas de phy- sica social. Ou a formula da Paz e de Nova
Ordem, ou a formula de Luta. Ou estructu-
rar sobre a fraternidade e com a luz, ou
arrebentar todas as estrueturas existentes, espe-
rando que do terror e da violencia possa
nas-
cer a nova Paz e a Nova Ordem.
A formula de Paz
só se póde extrair da realização da
igualdade nos pontos principaes
e no consequente reforçamento do prestigio
do Estado. Os 5 Direitos satisfazem, integral-
mente, a taes exigencias: em vez da
igualdade abstracta, que permittiu
subjazessem as mais injustas desigualdades, — a
igualdade concre-
ta
(escola única, absolutamente gratuita, di-
reito ao trabalho, á subsistência, á
assistencia
e ao ideal) ; em vez do Estado inerme, docil
ás ameaças e injuncções do capitalismo, —
o Estado que tem um Fim e póde convocar a todos, civis e classes armadas, para
a defesa do Fim do Estado, dos 5 Novos Direitos do Ho-
mem.
Os inimigos do
socialismo confessam que o capitalismo,
para sobreviver, teria de não falhar nunca e realizar a felicidade relativa
de todos. Ora, os factos mostram que é im-
possivel no Estado individualista. O
capitalismo, em si mesmo, é monopolizador, egois-
ta, insensivel ao grande numero. As
massas
já não crêem nelle. Nem voltarão a crer.
E'
uma impossibilidade psychologica. Permanecerá
algum tempo, dentro de um
Estado socialistano qual os actuaes
capitalistas se preparem e se reeduquem para a obra commum, subordinados á
perfeita realização dos 5 Direitos. E' o periodo de transicção, em estruc-
tura rija, — a estructura comprehensivel, sa-
bia, do
fim unico.
No appellar para
as Religiões, cujo peso social a tudo imprime estabilização e fixidez, commete
erro duplo o capitalismo: cria o abys- mo entre as Religiões mais generalizadas
e as massas, porque estas passam a julgá-las, na affirmação,
agora esquecida, da igualdade dos homens; e córta
todos os meios de realização
da igualdade humana pelos imperativos
espi- rituaes, — suggerindo a solução da força bru-
ta, e só da força bruta.
A Revolução da
primeira metade do Seculo XX é planetaria. Nada o impedirá. Mais
feliz o povo que effectuar, com menores
sacrificios, a sua transformação politico-social, que descobrir,
com mais clariviclencia, as suas instituições, a sua Lei. Não póde ser muito
differente da lei dos outros, salvo para os
povos votados ao desapparecimento. Os
povos que vão viver escolhem dentro de
formas possiveis em numero assaz
restricto. Ha um cerne commum a todo o
Direito Novo. Não exageremos as possibilidades
de variação. Antes de ser francês, o problema francês é humano; a miseria do
operario brasileiro é a miseria dos outros operarios, apenas com a differença
de
ser o typo intermedio entre o homem livre
da Europa e o homem do trabalho forçado, que a Sociedade das Nações apontou em
colonias inglesas, francesas e hollandesas.
O systema de toda
a Terra não se achou ainda. Nem é imprescindivel que se ache des-
de já. O que é preciso é achar a solução
de
cada país, no sentido da evolução geral.
Hesi-
tam os dois povos mais intellectuaes
do mundo: a Alemanha e a França; mas hesitam
caminhando.
Hesitar
parado é querer que, dentro do povo, o sangue não
cesse de correr e a fome se espalhe. Por outro lado, a nação mais technici-
zada do mundo, que é a norte-americana, tém
a audacia da autocritica e marchará para o
socialismo, afim que o Estado não desappare-
ça com a victoria do anarcho-syndicalismo.
Aliás, a technocracia,
de que tanto se fala,
não é bem clara quanto a attitude
pró ou
con-
tra
o Estado. A experiencia italiana póde ser levada, a principio entre fanfarras e
purpu-
ras, para
além da propria Russia.
Chi lo sa?
Em Espanha, Sancho Pança compromete a
Don Quixote e Don Quixote a Sancho Pança:
em quanto isso, a solução, subjacente, se
elabora. Na America do Sul, a questão das ter-
ras cria o problema preliminar de
arrebentar
os latifúndios e as bombas de sucção do
capitalismo estrangeiro parasitario terão de ser
rôtas num gesto só, para que a medida seja
vis-
ta como
geral e sem o caracter de hostilidade.
Para onde vamos?
Para a Unidade
nacional, sob o Socialis-
mo, ou para as separações, seguidas de
guer-
ras e dos rolos compressores de
extremismos sem luz.
O bom senso, a
clarividencia, o intuito
de evitar massacres inuteis e
prejudiciaes, tu-
do nos aconselha a dizermos, convictos, a
nos-
sa
palavra, como a Russia e a Italia disseram
as
suas. Esta,
provisoriamente.
A França e os
Estados Unidos da Ameri-
ca do Norte vão dar as suas soluções.
Temos
de pensar em nós mesmos.
A' nossa solução!
Ao Estado socialista, pela adopção fundamental dos 5 Direitos do Homem, a
technicidade da economia, as liberdades individuaes e a
codecisão dentro dos 5 Direitos:
1.
Direito á Subsistencia.
2.
Direito ao
Trabalho.
3.
Direito á
Educação.
4.
Direito á Assistencia.
5.
Direito ao Ideal.
O Estado dos 5
Direitos é a marcha decisiva para as fórmas mais altas de organi-
zação humana, os mais perfeitos graus da
republica de trabalhadores e consumidores. Governo das coisas a serviço de
todos; e não governo dos homens, a serviço de alguns, nem,
tão pouco, governo dos homens e das coisas
a serviço de um partido, como pretendem as soluções fascistas.
Perto da Russia,
pelo proposito de servir
a todos;
Perto da America
do Norte, pela techni- cidade;
Longe de toda
coacção á liberdade physi- ca e de pensamento;
Assegurados os 5
Direitos, — dê-se o ma-
ximo de expansão ao individuo;
Mas lutar,
solidaria e energicamente, contra todos os obstaculos aos 5 Direitos.
Portanto:
O socialismo
envolvente, constitucional;
A democracia
interior ao socialismo;
As liberdades do
Homem!
Tal caminho é o
que o nosso passado, o nosso presente e o nosso futuro nos apontam:
A Independencia,
sem sangue,
O 13 de maio, sem
sangue,
A Republica, sem
sangue,
O Estado socialista,
se possivel, sem san-
gue!
CAPITULO I
o
grande problema: a crise do estado
A
crise do Estado. Novas estructuras e novos
conteúdos de integração 7
1.
A
attitude de olhar as leis e a attitude de
querer. Nova ethica politica.
Autocracia e
democracia. Planteamento do
problema do
novo Estado 9
2.
As
autocracias. O universalismo temporal ca-
tholico. Novo rumo politico das
religiões.
Fracasso da democracia
representativa e da socialdemocracia. Necessidade de valores fi-
xos. O Estado socialista:
socialismo envol-
vente; a democracia como processo
envol-
vido 16
3.
Ha
fins que definem o Estado, ou póde o
Estado mudar de fins? Estado é
technica
social. Clareamento e precisão dos
fins do
Estado. Procura de um novo conteúdo
de
integração 21
CAPITULO II
a
violencia e o consentimento
Os
dois criadores de subordinação effectiva, de
ordem e de direcção: a violencia e
a adhe-
são continua. A incapacidade da
democra-
cia representativa para criar a
ordem 25
1.
Os
dois meios para se estabelecer o Estado
univoco: a violência, e a convicção
com-
mum (conteúdo de integração).
Socialis-
mo: Liberdade e Lei 26
2.
Manter
a ordem não póde ser fim: é princi-
pio improductivo. Incompossibilidade
da
solução com a politica economica manches-
teriana. Fins precisos e economia
dirigida
ou de plano 28
3. Como póde ser duradoura a integração poli-
tica. Vicio dos juristas: confusão
do logico
com o justo. Liberdades abstractas
e liber-
dades concretas
4.
Consequencias
do fracasso da democracia re-
presentativa. Irracionalismo da acção e me-
ditação da finalidade do Estado 32
5. Methodo do sábio e methodo do technico, do
investigador e do homem de acção. Males
do logicismo 34
CAPITULO
III
novos
direitos fundamentaes
Unica
solução fóra da violencia: o Estado so-
cialista 37
1. Conteúdo sufficiente de integração. O
direito
á subsistencia e o direito ao trabalho no
direito das gentes 37
2.
Iguaes
possibilidades a todos. Procura do
novo ethos, do principio fundamental do
novo direito 41
3.
Russia
e Italia
44
4. Os 5 Direitos do Homem e o conceito socia-
lista de liberdade
45
5. O problema moral o juridico da esmola.
Rea-
lização dos 5 Direitos 47
CAPITULO IV
technica
constitucional dos 5 direitos
Os
direitos abstractos das Declarações. Um tre-
cho de Fourier
51
1.
O
direito á subsistencia no Estado pluripar-
tidario alemão e na Rússia
unipartidaria.
Pouco mais de meio secjilo depois
de Va-
cherot. Direito publico siubjectivo
e situa-
ção objectiva. Solução nova 52
2.
Algumas
notas históricas sobre o direito á
subsistência. Fourier. Considérant,
Prou-
dhon, Marx, Engels, Glais-Bizoin. Necessi-
dade de reconstrucção social 57
3.
Direito
ao trabalho no Estado individualista
e no Estado socialista. Devedor do
direito
ao trabalho: o Estado. Credor do
direito
ao trabalho: o homem. Meios technico-fi-
nanceiros para assegurar-lhe a
execução 63
4. O problema da escola. O direito á
educação 68
5.
Direito
ao ideal. Meios de producção artística
e
scientifica. Educação physica 74
CAPITULO V
conclusão
Fim
único condição necessaria e sufficiente 77
1. Univocidade do Estado. Socialismo
envolven-
te, e não socialismo envolvido.
Vontade e
Verdade
78
2. Medidas para que se não comprometam
os
5 Direitos do Homem. Regime do trabalho
em vez de dominação plutocratica 83
3.
Trabalho
aos que pódem trabalhar. Sustento
aos que não pódem trabalhar. Eliminação
de lodo o parasitismo 85
4.
Estado
coordenador e previdente. A nova
Paz, a nova Ordem e a nova Lei 86
5.
Revolução
planetaria no Seculo XX. Povos
que hesitam, caminhando. Perigo de he-
sitar parado. Para onde vamos? 89
[1] E' o que Saint-Simon
denomina "o fim com-
mum
dc actividado"; Auguste Comte, a "convergência ef- fectiva"; a
"communhão real e estável", oriunda da "neces-
sidade
espiritual de pontos fixos" (Cours de Philosophie positive, 3ªed„ Paris,
1869, t. IV, p. 49, 46), de um
systema
de idéas geraes (Systeme de
Politique positive, Pa-
ris,
1854, t. IV, App. général, p 63); Buchez,
certa
doutrina,
certa crença, a "indicação de certas transformações que a sociedade é
chamada a operar em si mesma, seja no mundo humano, seja na natureza
bruta" (Traité de Politique, Paris, 1866, t.
I, p. 47; Introduction à la Science
de l'Histoire, 2e
ed,. Paris, 1842, t. I, p. 228).
[2]
Buchez, Traité de Politique, Paris, 1866, t. I, p. 57.
[3]
Nosso curso na Académie de Droit International de
la Haye, Recueil d es Cours, 1932.
[4].
Constituição alemã, art. 163, 2ª alinea: Jedem
Deutschen soll die Möglichkkeit gegeben werden, durch wirtschaftliche
Arbeit seiner Unterhalt zu enwerben. Soweit ihm angemessene Arbeitsgelegenheit
nicht nachgewiesen werden kann, wird für seinen notwendigen Unterhalt ge-
sorgt. Das Nãhrere wird
durch besondere Reichsgesctze
bestimmt".
[5] Pontes de Miranda, Os Fundamentos
actuaes do Di-
reito constitucional, Rio de Janeiro, 1932, p. 386.
6 PONTES DE MIRANDA, La Conception du droit inter-
national
privé, Recueil des Cours de l’Académie de Droit In-
ternational,
1932.
[6] Vacherot, La démocracie,
2e ed., Bruxelles, 1869,
p. 241.
[7] Pontes de Miranda, Systema de
Sciencia positiva do Direito,
Rio de Janeiro, 1922, vol. II, p. 234, n. 2.
[8] Era o que já mostravamos em 1922 (Systema,
II,
p.
234) : "O direito social de intervenção collectiva, pelo Estado ou por
outro orgão da sociedade, afim de tirar os individuos da sua impotencia, da sua
miseria, ou da sua immoralidade, encontramo-lo em todas as épocas, mais ou
menos intenso, sob formas despoticas ou liberaes, e póde tornar-se, no
individualismo, conjunto de direitos subjecti-
vos publicos attribuidos
a cada individuo (direito ao traba-
lho, á assistencia,
á instrucção gratuita, á hygiene, etc.)".
[9] Traité de l’Association,
Paris, 1822, t. I, p. 125:
"... assurer au peuple un minimum de subsistance, vêtement,
logement et plaisirs"; — Le nouveau monde industriel
et societaire, Paris, 1829, p. 4, 12, 38, 42, 74, 185, 328;
420: "Le premier signe de justice devrait être de garan-
tir au peuple un minimum croissant en raison du progrès social."
[10] Systema de Sciencia
positiva do Direito,
Rio de Ja-
neiro, 1922, vol.
II, p. 455.
[11] Cp. Georg Adler, Das Recht auf Arbeit,
Handwör- terbuch der Staatswissenschaften, Jena, 1893, t. V, p. 363-370; —
Ueber die Aufgaben des States angesichts der Arbeitslosigkeit, Tübingen, 1894. p. 16-23.
[12] Walter Kaskel, Das neue
Arbeitsrecht, Berlin,
1920, p.
93.